Domingo, 6.
Chou Chou que eu acompanhei desde o
tempo de Hollande como Ministro da Economia nunca me enganou. Sempre percebi de
que lado estava, que função exercia sobre ele a mulher, qual era a sua ambição,
que tipo de vida lhe interessava, que modelo de mundo era o seu. Daí que não me
surpreendam os movimentos de descontentamento que correm a França de Norte a
Sul, o género de política que quer impor à força, a indiferença e até algum
nojo que lhe causam os franceses “desdentados” que descem à rua a exercer a
democracia contra o homem que se diz sem ideologia nem partido. O Primeiro de
Maio foi terrível, parecia a reedição do Maio de 68. No centro de Paris muitos
carros incendiados, montras partidas, violência, grandes manifestações. Com
segunda edição, ontem, onde Mélenchon conseguiu reunir nas ruas 160 mil pessoas,
todas contra as políticas de trabalho, saúde, velhice. Eu sempre disse que
ninguém faz farinha com os franceses. Eles são terríveis a reivindicar os seus
direitos. As sondagens dizem que 6 em cada dez franceses estão descontentes com
Chou Chou e querem vê-lo dégagé.
- Por cá, sub-repticiamente, vai-se instalando a ideia que os políticos
ganham mal e, portanto, nestas condições são perdoáveis certas atitudes,
roubos, estratagemas de corrupção e conluio. Como se a seriedade, a
honestidade, a integridade fossem princípios que se regem por valores
económicos e financeiros, ou como se o latrocínio ficasse abastado com um
salário milionário. Se assim fosse, milhões de trabalhadores portugueses, que
ganham dez por cento do vencimento de um qualquer deputado do batalhão amorfo que
ali está a responder pela voz do seu dono seriam ladrões, salteadores, gente da
pior espécie. Os dois milhões de pobres que as políticas socialistas não
tiraram da pobreza, viveriam, com direito, pura e simplesmente, do assalto a
mão armada. A prova está nas centenas de políticos que não se contentaram em
furtar trocos - roubaram milhões e milhões. Veja-se, por exemplo, o
aproveitamento que alguns deputados fazem
das bebesses a que chamam direitos. Eu tive um empregado na agência de
publicidade que foi o mais medíocre dos muitos que por lá passaram. Se não me
engano chamava-se Arede. Pois, este Arede, algum tempo depois de ter sido
despedido, vejo-o na televisão como... deputado! Sabem o que lhes digo: isto já
lá não vai. São três gerações a alimentarem-se do mesmo sangue, dos mesmos
esquemas, dos mesmos silêncios, da mesma cumplicidade. Por mim, não me calo e,
embora compreenda Diderot que agora me ocorreu (“Só pensamos, só falamos com
vigor do fundo do nosso túmulo. É aí que nos devemos colocar, é daí que nos
devemos dirigir aos homens.”) é aqui, do centro das palavras e da revolta, que
expilo o que me vai no coração.
- Este país não existe. Tomado pelo futebol, alienado em vidas
salmodiadas de coisinhas caricatas, apresenta um espectáculo ridículo,
patético, com milhares de treinadores a botar discurso sobre a grandeza do que
se passa dentro do campo. Não há português algum que não tenha um parecer, uma
técnica, um ódio, uma raiva travada, uma alegria breve, um suspiro de pranto
quando a câmara de televisão o faz por instantes herói e lhe diz que ele existe
e valeu a pena ter nascido para nos dizer o que pensa do triunfo da sua equipa,
do seu treinador, do seu presidente.
- Não existe este país?! Ó desgraçado, não vês as festas que se sucedem,
andam umas pegadas às outras, as ruas estão a abarrotar de gente, estrangeiros
e nacionais, o sol rompeu os poros do firmamento e parece que desta vez veio
para ficar, olha as praias já cheias, as praças onde a propósito de uma canção choné
e sem estrutura musical, se levantou um festival que nos transporta por alguns
dias à estratosfera do nosso contentamento. Somos ou não somos um povo feliz,
homem de Deus! Haverá no mundo algum canto mais radioso como este! Vai, sorve o
momento, mas fá-lo sem olhar para o lado, como se só tu existas e de ti mesmo
saiam os bombos, as cornetas, as guitarras, os violinos e toda a artilharia
musical que te faz sentir num país de sonho.