domingo, maio 06, 2018

Domingo, 6.
Chou Chou que eu acompanhei desde o tempo de Hollande como Ministro da Economia nunca me enganou. Sempre percebi de que lado estava, que função exercia sobre ele a mulher, qual era a sua ambição, que tipo de vida lhe interessava, que modelo de mundo era o seu. Daí que não me surpreendam os movimentos de descontentamento que correm a França de Norte a Sul, o género de política que quer impor à força, a indiferença e até algum nojo que lhe causam os franceses “desdentados” que descem à rua a exercer a democracia contra o homem que se diz sem ideologia nem partido. O Primeiro de Maio foi terrível, parecia a reedição do Maio de 68. No centro de Paris muitos carros incendiados, montras partidas, violência, grandes manifestações. Com segunda edição, ontem, onde Mélenchon conseguiu reunir nas ruas 160 mil pessoas, todas contra as políticas de trabalho, saúde, velhice. Eu sempre disse que ninguém faz farinha com os franceses. Eles são terríveis a reivindicar os seus direitos. As sondagens dizem que 6 em cada dez franceses estão descontentes com Chou Chou e querem vê-lo dégagé.

         - Por cá, sub-repticiamente, vai-se instalando a ideia que os políticos ganham mal e, portanto, nestas condições são perdoáveis certas atitudes, roubos, estratagemas de corrupção e conluio. Como se a seriedade, a honestidade, a integridade fossem princípios que se regem por valores económicos e financeiros, ou como se o latrocínio ficasse abastado com um salário milionário. Se assim fosse, milhões de trabalhadores portugueses, que ganham dez por cento do vencimento de um qualquer deputado do batalhão amorfo que ali está a responder pela voz do seu dono seriam ladrões, salteadores, gente da pior espécie. Os dois milhões de pobres que as políticas socialistas não tiraram da pobreza, viveriam, com direito, pura e simplesmente, do assalto a mão armada. A prova está nas centenas de políticos que não se contentaram em furtar trocos - roubaram milhões e milhões. Veja-se, por exemplo, o aproveitamento que alguns  deputados fazem das bebesses a que chamam direitos. Eu tive um empregado na agência de publicidade que foi o mais medíocre dos muitos que por lá passaram. Se não me engano chamava-se Arede. Pois, este Arede, algum tempo depois de ter sido despedido, vejo-o na televisão como... deputado! Sabem o que lhes digo: isto já lá não vai. São três gerações a alimentarem-se do mesmo sangue, dos mesmos esquemas, dos mesmos silêncios, da mesma cumplicidade. Por mim, não me calo e, embora compreenda Diderot que agora me ocorreu (“Só pensamos, só falamos com vigor do fundo do nosso túmulo. É aí que nos devemos colocar, é daí que nos devemos dirigir aos homens.”) é aqui, do centro das palavras e da revolta, que expilo o que me vai no coração. 

         - Este país não existe. Tomado pelo futebol, alienado em vidas salmodiadas de coisinhas caricatas, apresenta um espectáculo ridículo, patético, com milhares de treinadores a botar discurso sobre a grandeza do que se passa dentro do campo. Não há português algum que não tenha um parecer, uma técnica, um ódio, uma raiva travada, uma alegria breve, um suspiro de pranto quando a câmara de televisão o faz por instantes herói e lhe diz que ele existe e valeu a pena ter nascido para nos dizer o que pensa do triunfo da sua equipa, do seu treinador, do seu presidente.


         - Não existe este país?! Ó desgraçado, não vês as festas que se sucedem, andam umas pegadas às outras, as ruas estão a abarrotar de gente, estrangeiros e nacionais, o sol rompeu os poros do firmamento e parece que desta vez veio para ficar, olha as praias já cheias, as praças onde a propósito de uma canção choné e sem estrutura musical, se levantou um festival que nos transporta por alguns dias à estratosfera do nosso contentamento. Somos ou não somos um povo feliz, homem de Deus! Haverá no mundo algum canto mais radioso como este! Vai, sorve o momento, mas fá-lo sem olhar para o lado, como se só tu existas e de ti mesmo saiam os bombos, as cornetas, as guitarras, os violinos e toda a artilharia musical que te faz sentir num país de sonho.