Terça, 19.
Domingo
passado descobri uma pequena igreja ao lado do campo de futebol, em Setúbal.
Curioso, espreitei. Chama-se a igreja do Senhor do Bonfim, o mesmo nome com que
os portugueses que foram daqui batizaram a Baía no Brasil. Acabei por assistir
ao Santo Sacrifício da Missa que estava a começar. As dimensões são muito
pequenas, talvez uns cento e cinquenta metros de comprimento por cinquenta de
largura. O altar-mor do século XVIII com elementos do século XVI como as
colunas, é esmagador de talha dourada de um barroco luxuriante. Ele só forma o
todo da igreja, porque nós só temos olhos para aquele volume de madeira
esculpida a rigor, com profundidade e altura que abafa os azulejos do séc.
XVIII que contam a vida de Jesus e forram as paredes laterais do templo. O mais
surpreendente ainda, é o mistério que se desprende dela, como que aproximando
os fiéis do sacerdote, todos em união com o Senhor exposto no pequeno
tabernáculo lateral fora do conjunto arquitectónico central. Adianto também o
facto de ter a celebrar a missa o mesmo padre que encontro na igreja de S.
Julião hora e meia depois. Simplesmente nesta do Senhor do Bonfim, com uma
acústica maravilhosa, ao contrário daquela outra no Largo do Bocage, bebemos as
palavras do celebrante não nos escapando nenhuma sílaba. A assistência devido
talvez à hora (9 da manhã), era essencialmente formada por gente de mais idade,
com vozes todavia cristalinas que enchiam os corações e nos aspiravam para o
céu. É como se estivéssemos em nossa casa e um sacerdote amigo se deslocasse
para dizer a missa só para nós. Doravante, irei lá ao domingo.
- O furacão Maria à sua passagem pela
ilha Dominica, só deixou pedra sobre pedra. Ficou tudo arrasado e as populações
viram-se de súbito no meu do silêncio das ruínas com as suas próprias almas a
errarem por lugares de terror. É impressionante e assustador. A Terra terá
sempre desafios e segredos que a humanidade nunca desvendará.
- Vou a meio das seiscentas e
cinquenta páginas do romance histórico de Maria João Lopo de Carvalho, Marquesa de Alorna, ou seja Alcipe. O
que há de surpreendente na forma narrativa, é o facto de o seu autor ser uma
mulher. De facto, há detalhes, expressões, abalos de coração, feridas expostas
que só uma escritora podia contar – e Lopo de Carvalho conta muito bem, sem que
tropecemos nos capítulos e na marcha da narrativa.
- O tempo mudou. Ontem entrei na
piscina e saí cheio de arrepios. Se assim continua, vou adormecer a água e
passar a nadar nas instalações públicas da vila. Entretanto, apressando-me para
conseguir ainda secar a lenha, acabei a poda do medronheiro. Este ano, no
Inverno, gostava de aparar substancialmente os cedros em torno da quinta, de
modo a deixá-los com no máximo cinco metros de altura. Toda a gente me desaconselha
a fazê-lo. O Carlos Soares a semana passada disse-me para não lhes tocar porque
me defendem do vento, são bonitos e não constituem perigo de arder. Mas eu
assustei-me este Verão, sobretudo quando vi que o meu vizinho deixou a sua herdade
ao abandono com o eucaliptal à solta.