terça-feira, outubro 03, 2023

Terça, 3.   

Tudo se complica. Putin desde a primeira hora que conta cheio de paciência com a divisão da Europa no apoio à Ucrânia. E terá alguma razão. A recente eleição do primeiro-ministro eslovaco pró-Putin, prova isso mesmo. Pelo sim, pelo não, enquanto as negociações para formação do Governo prosseguem na Eslováquia, quem não se deixa arrastar, é a república Checa e a Polónia, membros da UE como a Eslováquia, que estão já a fazer controlos nas suas fronteiras. Mas a expectativa maior, está nos EUA. Se Trump alcança de novo o poder, o mundo virará do avesso. 

         - Entretanto, o mundo no seu todo aproxima-se do desastre total. Todos os dias conhecemos a ponta desse icebergue medonho. Ontem no Sudão com a morte de 1200 crianças devido à fome, epidemias, má nutrição, sob o fundo da guerra levada a cabo por dois generais; em Lampedusa o espectáculo desumano de vidas aportadas ao cais em busca de paz e prosperidade e prontamente rejeitadas pela UE;  depois as intempéries no Líbano onde a corrupção foi a causadora do rebentamento das barragens que inundaram parte do país; agora o martírio dos arménios numa zona com intervenção da Rússia no enclave de Karabakh e passo porque os horrores são sempre acções de ditadores que arrastam para a morte a juventude obrigada a combater em nome das suas loucuras e ganâncias. 

         - Na Fertagus, não sei por que razão, no interior dos comboios não havia energia. Deste modo, sempre que surgiam túneis a escuridão dentro da carruagem era total. As pessoas acumulavam-se umas contra as outras e durante aqueles trajectos sem luz, o mistério adensava-se. Então pensei em Ana Boavida que decerto numa situação como aquela era assaltada por fantasmas sem freio. Assim dei comigo a imaginar o que acontecia naqueles longos momentos em que o comboio seguia mergulhado no mais denso negrume e os corpos tocavam-se num frisson que o ruído do ferro abafava ou disfarçava. Vi o rapaz que ia na plataforma a coçar as coxas nas mamas da rapariga que as trazia à mostra; ou aquela negra, grande como tudo o que é medonho e cresce quando o comboio entra no túnel e a excitação paralisa num amplexo o negro que vinha a olhá-la quando o sol deixava ver o jogo claro-escuro dos sentimentos; ou aquele rapazinho de unhas pintadas, em calções, que se levantou na primeira passagem da noite para deixar um sorriso cúmplice a um outro de aspecto macho, mas redondo de sorrisinhos, o ombro ligeiramente descaído para a ternura que só floresceu durante a passagem escura; ou aquele macho, vigoroso, rosto de estúpido, coxas sólidas que deixava escapar todavia qualquer coisa misteriosa que fixava com olhar terno a madura de mamas a espreitar de um corpo disforme. Despi quando a escuridão invadia o interior, toda aquela gente, sacudida, corpo contra corpo, forma contra forma, numa antevisão dantesca que será a de um dia quando a humanidade, desavergonhada e impune, começar a andar completamente nua. Nessa altura é a própria sexualidade e a beleza dos corpos na perfeição divina, que se afastará para todo o sempre da matriz original. 

         - Estive umas horas no meu esconderijo bem climatizado no C.I.. O que saiu foi pouco, mas queira Deus que ao menos seja bom.