segunda-feira, janeiro 23, 2023

Segunda, 23.

Tendo feito várias tentativas frustradas para escrever o texto que ontem publiquei, em desespero, abalei para o bar da Fnac no Chiado. Guardava a ideia dos tempos em que ali vivi, gostarem os lisboetas e os provinciais radicados na capital (a maioria), de se rebolarem na cama até tarde ao domingo. Não me enganei. Os tempos não mudaram assim tanto, nem os portugueses se transformaram por haver mais auto-estradas, arranha-céus, restaurantes, centros comerciais e terem passado a comer mais carne e torresmos. Com efeito, às dez horas e meia da manhã quando entrei, estava apenas um jovem escritor e uma dama entradote: ele a escrever decerto o romance da sua vida que ela mais tarde iria ler. Mal me viu sorriu, eu retribui e, como bons cavalheiros discretos, ficámos de costas voltas e distantes não se desse o caso de ele querer espreitar o meu trabalho ou o inverso. Bref. Depois da bica e um palmier coberto de uma pasta de açúcar (horror! horror!), comecei lentamente a explicar explicando-me, a descarga que se tinha operado no meu cérebro. O escrito ficou acabado pela uma e meia da tarde, quando o bar começava a compor-se de clientela domingueira. Muito antes, o meu camarada escrevinhador como eu, tinha saído (satisfeito?) com a produtividade da manhã. Bref. Para espairecer os miolos (escrever dá cabo deles), fui deambular pelo Rossio e Restauradores quase sem ninguém, esplanadas vazias, um ligeiro frio enxotado das praças e enfunando as ruas paralelas mais compostas de comensais e alguns estrangeiros. Almocei no Vitta Roma (mal) e enquanto comia, fui retocando o texto. A Avenida de Roma era uma língua comprida, gélida, que não expelia invejas e mexericos (louvado seja Deus!).

         - Luís Montegro diz-se “actor político”. Nada a acrescentar.

         - Se dermos crédito ao palestrador da SIC, a maioria dos governantes é gente séria, “boas pessoas” e competentes. O problema é que a carrada de deputados, secretários de Estado, ministros, autarcas, empresários ex-políticos são tantos e alguns próximos dele, embora indiciados disto e daquilo, não abdicam dos cargos que ocupam. 

         - Outro dia li no Público que a saloia que comanda a TVI, comprou um par de sapatos por 490 euros! O problema é saber se os pés valem esse valor. A idiota, comentou: “Estes sapatos custaram-me uma fortuna, para muitos de vocês, é o que ganham num mês.” É este o país que temos; é gente desta espécie que tem o poder de impingir toda a merda que vomitam com petulância e imoralidade. Por mim, não conto pelos dedos das mãos as vezes que sintonizei (por engano) o canal da pequena fraldiqueira. Dizem-me que António Costa vai a todas e até Jerónimo de Sousa foi conversar com a vulgar personagem. Se a política fosse coisa honesta e moralmente exercida, os políticos não teriam necessidade de se vergar a tão insignificante criatura. 

          - Depois das leituras após o almoço, voltei a pegar na roçadora e atirei-me ao muito trabalho que aqui há para fazer. Faz frio, fazia já ontem à noite. Apesar de sentir o desconforto de alguns calafrios, não acendi a lareira. Subi lá acima e trouxe um cobertor que pus sobre as costas e a manta inglesa nos joelhos. Esta manhã, querendo ir às mercas, tive de raspar a grossa crosta de gelo que estava por toda a quinta e havia coberto totalmente a viatura. No Norte cai neve abundante. Na França também, diz-me o francês que hoje me visitou para um café e amena cavaqueira. Vou acender a lareira. E é isto.