segunda-feira, novembro 08, 2021

Segunda, 8.

Francis, inopinadamente, apareceu e almoçou connosco. Grande repasto com a sua contribuição bom vinho Côte du Rhône, queijo Maroille e gateau au chocolat fondant. Após o café passámos ao salão e no meio da conversa, ei-lo que desliza a cabeça, alonga o corpo no sofá e desaparece no sono profundo deixando-me, literalmente, a falar sozinho. Acrescento que só à sua conta foi-se uma garrafa. Bizarre

         - Tudo o que contei ontem num longo escrito de quatro páginas, ficará para os leitores futuros (se os houver). 

         - Prazer de receber chamadas telefónicas das amigas e amigos com quem falo com assiduidade: Carmo Pólvora, Alice, João, Marília, Príncipe, entre outros. Todos trazem na voz o quotidiano que deixei para trás, o país que passou para segundo plano. Carmo quando lhe falei do museu Louis Vuitton, disse-me que tinha estado como convidada na inauguração, em 2014. 

         - Estou de novo tolhido. Ao descer as escadas para o rés-do-chão, dei um jeito à perna direita que por todo o lado é admirada por rapazes e homens feitos, e senti um estalo seguido de paralisação. Vou ter que voltar ao anti-inflamatório e ao gel à base de plantas se quiser prosseguir as minhas muitas andanças por Paris. 

         - Reservo todos os dias duas horas à leitura de Julien Green. São momentos inolvidáveis de prazer, isolado no meu quarto, o ruído de fundo vindo da cozinha onde Annie prepara ao seu ritmo vagaroso as refeições. Instantes de paz, felicidade, irmanados no mesmo amplexo, como se a minha vida se cruzasse com a do meu autor e o mundo fosse um lampejo de pura invenção e tudo fosse verdadeiro e falso e ligeiro e profundo. De quando em vez, tropeço na magia das citações de Green como esta, página 143, a propósito das bibliotecas das pequenas cidades americanas “... ces oasis où l´on peut oublier les fatigues du désert”.   

         - Em França ninguém diga que está seguro. Hoje um polícia foi esfaqueado em Cannes. Parece que o agente não brincava em serviço pois trazia o colete à prova de bala. O suspeito de nacionalidade argelina, no momento do ataque, gritou o nome do profeta Maomé. 

         - Dia radioso de sol apesar do frio que nos encrespa o rosto.