quarta-feira, julho 31, 2019

Quarta, 31.
Cenas de psicopatologia da vida moderna.

1 - Na gare de manhã cedo, uma rapariga e um rapaz. Ele está encostado ao muro da escada, ela estirada sobre ele num frenesim de beijos no pescoço dele. O rapaz, por cima das costas dela, brinca tranquilamente no seu telemóvel.

2 – Durante a viagem, um homem de uns trinta anos fala ao telefone. Todos os que estão próximos ouvem a ladainha que durou do Pinhal Novo a Sete Rios. Percebe-se pela conversa que as aflições de dinheiro são muitas lá em casa. A dada altura a voz sobe de tom: “Vai comprar pão. Come pão. Dinheiro? Compra farelos, é mais barato.”

3 – Chegado o metro, entro de rolha. Uma rapariga atira-me a mim e a mais dois passageiros literalmente para dentro da carruagem. Duas estações adiante, um passageiro quer sair, mas está a barrar entrada uma miúda de fones e telemóvel. Digo-lhe: “ela não ouve, está fechada no telemóvel”. Então um matulão que aguardava para sair, arranca-lhe o auricular direito e todos aproveitam para deixar o transporte.


4 – No regresso, estou comodamente sentado, quando numa aflição entra uma carrada de pessoas que pareciam vir a fugir da policia. Uma mulher monumental, desagua no banco em frente do meu – uma mama enorme saltou-lhe do vestido, mas ela agarrada ao telemóvel, não deu por isso. Aquela coisa gorda, por assim dizer pendurada e agigantada, atrai os olhares de todos, especialmente de um negro, e ninguém ousa dizer à criatura que guarde o que perdeu. É uma mulher com um par idêntico ao seus que, entrando na estação seguinte, lhe bichana ao ouvido qualquer coisa. Um sorriso descontraído para mim que estava na frente, fechou o episódio de nudismo citadino. O africano passou a língua na serra dos lábios e suspirou.