Terça, 19.
Como
disse as filas para a compra de bilhete no Corte Inglês eram várias e
serpenteavam até lá atrás à esplanada dos almoços e jantares. Estou eu numa
delas e à minha frente tenho uma criatura muito produzida que de súbito quando
estava prestes a chegar à bilheteira, zarpa para outra fila ao lado onde está
estrategicamente colocado o filho a um espectador de adquiri a entrada. A
senhora que está atrás de mim, barafusta: “Tá a ver a esperta! – Está a ver a
utilidade da família!” digo eu. Evidentemente, aquele rapaz vai encaixar como
mérito saudável da família no futuro não só a sua qualidade de consumidor como
de trapaceiro. A televisão com os seus concursos, os seus prémios, os seus
espectáculos encarreirados à querida família, que gasta o que tem e não tem em
porcarias que lhe impõem, devia explicar a essas almas cada vez mais desunidas,
que os princípios morais e sociais são a cativação mais importante de todo o ser
humano independentemente de ter constituído família ou não.
- Conversa com o João no bar da
livraria Bertrand. Pelo que percebi, aquilo anda tudo pegado por causa da lista
dos Nobel da Brasileira. Eu estou lá metido e disse hoje ao Corregedor que
tanto se me dá que me inscrevam como jornalista ou escritor. A minha cabeça não
tece loas de importância de espécie alguma. Estou-me literalmente nas tintas. O
que me agrada, como aconteceu esta manhã, é aquela reinação livre que se
estabelece entre nós e onde desagua tudo e mais alguma coisa. Foi, pois, com
prazer que ouvi o Gordilho - que todos dizem ter uma óptima tola -, recordar
personagens, lugares e situações. O café tem andado quase vazio, não se sabe
por onde andam os estrageiros.
- Ando completamente rendido à escrita
de George Sand. O livro conta a história de um período em que ela e Chopin na
altura seu namorado como hoje se diria, passaram em Palma de Maiorca. Ela quis
que o livro fosse um romance, mas os espanhóis no século XIV atiraram-se à
autora, melhor dizendo porque esse era o seu desejo, ao autor, devolvendo-lhe
as afirmações injuriosas com todos os epítetos expostos no Un hiver à Majorque. Apesar da sua veia socialista, Sand não se coíbe
de dizer as coisas mais incríveis do povo que lhe surgiu ao caminho e na enxurrada
nem o músico escapa.