Quarta, 13.
Eu
nunca percebi a razão de haver dois sistemas de saúde: o SNS e a ADSE. Se somos
todos portugueses, descontando para o mesmo patrão, ganhando miseravelmente,
tendo as mesmas doenças e achaques... Talvez a temperatura no bolso seja mais
alta para os funcionários públicos e as maleitas neles mais refinadas devido ao
esgotamento acentuado, às frequentes greves, ao falatório e desleixo em
consequência nas repartições públicas, sobretudo, à segunda-feira, ou ainda
porque ganham menos que os empregados no sector privado, vá-se-lá-saber-porquê,
eles podem escolher com descontos simpáticos entre ir a um ou outro sistema.
Portanto, a sua saúde é de melhor qualidade, embora o dono seja o mesmo e os
descontos também. Só posso concluir que se trata de um privilégio inadmissível
em democracia e num Estado republicano. Eu penso que esta é mais uma anomalia
do antigamente, quando éramos governados pelo Estado Novo. Talvez não tenha
razão. Seja como for, os privados instalaram agora uma guerra ao romperem os
acordos que tinham com o Estado por este lhes exigir a restituição de milhões
facturados a mais. Aqui d´el rei, gritam os funcionários públicos que não
querem ser assistidos pela segurança dos pobres e apalermados doentinhos do
SNS. Barafusta este sistema porque teme a invasão dos patrícios habituados ao
melhor tratamento. Riem-se os hospitais privados que pensam ficar apenas com os
ricaços que detestam a cambada arrogante dos funcionários do Estado. E
gargalham os infelizes do SNS que, vingando-se, vão ter nos bancos de espera
dos hospitais, centros de saúde e misericórdias por companhia a massa compacta dos
mangas de alpaca com o jornal A Bola nas mãos a disfarçar a descida de
categoria. Só a corajosa Ministra da Saúde fica no pedestal da sua competência,
se ousar consertar as coisas e provar aos gananciosos dos negócios da vida
humana, que vão ter que falir por falta suficiente de doentes a bater-lhes à
porta. Agora para mim que sou dado a conjecturas, não deve ser alheia toda esta
trapalhada nesta altura, quando a Ordem dos Enfermeiros tem à sua frente uma
mulher apalermada, espécie de catavento, de uma infelicidade abismal. Mas isto
são pensamentos meus.
- Reflexão enquanto cortava o relvado
ao que disse as dez da manhã: se a ministra Marta Almeida Simões não ceder,
acho que esta é uma oportunidade única de equilibrar os interesses em jogo,
robustecendo o Serviço Nacional de Saúde. Percebo que é preciso estofo tendo em
conta o múltiplo xadrez em equação, mas também é em momentos destes que se vê o
génio dos políticos.