domingo, dezembro 02, 2018

Domingo, 2.
Os tumultos de ontem em Paris, foram mais de muito mais. Embora não esteja de acordo com a brutalidade de carros incendiados e lojas destruídas e pilhadas, conservo-me do lado dos “gilets jaunes”. Porque na origem da desordem, estão as ordens do primeiro-ministro no sentido de suster pela força os manifestantes. Quem desde a origem não quis negociar e disse que não movia uma pedra da decisão tomada e não havia nada a ajustar, foi Chou Chou valente com as costas quentes da Polícia. Volto à carga: esta brutal indignação, é fruto de anos de má governação, políticos incompetentes e corruptos, de joelhos ante o grande capital, alienados a lóbis, incapazes de separar o público do privado. A sociedade, tal como a temos aceitado pacificamente, está a mudar. O povo sabe que as ordens, os decretos-lei, a panóplia de interdições, fiscalidade, proibição de liberdades várias, feitas com a leveza de uma caneta que assina as ordenações, é mais brutal que as acções ontem e no sábado passado levadas a cabo pelas pessoas que nas redes sociais de solidarizaram. Não há polícia capaz de suster quem vive humilhado, no limiar da pobreza. Chou Chou, a semana passada, ante os acontecimentos, em vez de dar resposta ao que eles condenavam, fez aquilo que fazem sempre os políticos sem dimensão – disse que ia constituir uma comissão para estudar o assunto. Forma de ganhar tempo, de dar extensão para que as coisas amainassem e depois entrassem na ronceirice habitual. Enganou-se. Sem experiência nem voo de grandeza, trancado na vaidade da entronização de rei da França, ficou ainda mais isolado. Depois encostou-se a António Costa e fez aquilo que o líder socialista faz - também sob a forma de uma aldrabice -, prometeu descer os combustíveis se o preço do mercado aumentasse demasiado. Os franceses não são os portugueses. Nós temos a gasolina mais cara do que eles, mas gostamos de ser enganados, vemos com bons olhos a disparidade entre ricos e pobres, assumimos a nossa humilde condição como triste destino que cinquenta anos de salazarismo e Igreja retrógrada nos impregnou. Alheio a esta desordem, está, evidentemente, a querida globalização. Trump, honra lhe seja feita, tenta desfazer esta ruína que destruirá as nações mais pobres e porá ao serviço das multinacionais milhões de povos. Ao banqueiro governante, nada lhe diz os 200 feridos, os 200 e tal detidos, os polícias agredidos. O banqueiro que é por natureza um especulador, apenas lhe interessa a ordem pública, os bancos atingidos pela cólera, as lojas desfeitas e o poder. Todo o tempo que estive na terra dos francos, apenas ouvi falar do Planeta, do ozono, da eliminação das viaturas e assim. Antes não se calavam com competitivité e harcelement. Este ano o chique era a conservação do Planeta. Mas sobre esta teoria, falarei um dia destes.


         - Bom. Aliviemos a tensão. Assim que desembarquei, ocupei meia hora a apanhar medronhos. A árvore sufoca do fruto vermelho que embebeda os pássaros que deles se abasteceram na minha ausência. Houve tempos que fazia uma aguardente fabulosa. Hoje farei quando muito compota e tartes. Mas ao largo, na quinta do meu vizinho, completamente tratada da praga dos eucaliptos, estende-se o campo risonho que voltou às origens. Também o trabalho que ele desenvolveu para equilibrar pinheiros e sobreiros na minha propriedade, fez com que os horizontes crescessem, alargassem e tornassem este espaço mais liberto da opressão da desordem que ele instalou ao abater braços possantes das minhas árvores. Acresce que só a lenha obtida, faz com que, somada ao abate dos meus arbustos no início deste ano, tenha lenha para alimentar as lareiras para três ou quatro anos.