terça-feira, outubro 24, 2017

Terça, 24.
Quando os amigos chegam pela primeira vez, a suprema observação vem na forma de  um desabafo: “Como consegues tu viver neste sítio!” e logo depois a sacrossanta pergunta: “Não tens medo de aqui viver?” O que diriam eles se soubessem que a noite passada (de longe a única), tendo andado durante o dia entrar e sair, acabei por deixar o portão aberto e, ainda por cima, esqueci-me das chaves na porta de casa do lado de fora. Brrrrrrrrrrr, que medo!

         - Nas cento e tantas páginas que leva o romance O Juiz Apostolatos, Flávio vai-se construindo do lado metafísico da vida; ao contrário de Rui que o seu pragmatismo revela o lado tenebroso de o mundo de hoje. Ambos são sócios da Imprimum, mas de tal modo opostos que anseio por saber como vão eles terminar os seus dias.


         - Já tinha desmontado o verão lá fora no terraço. Mas como o estio se recusa a deixar-nos, voltei a colocar coxins e a retirar os resguardos das mesas e cadeiras. É lá que leio e muitas vezes trabalho. Sob a luz clara que nesta altura nos inunda, e aviva as cores que se preparam para reconhecer o Outono e instala por todo o lado a doce ternura de um tempo entre dois tempos, por lá fico até anoitecer. O silêncio não pára quieto, segue a luz que por sua vez acompanha os restos de sombra que em verdade nunca abandonam a terra. É neste cruzamento de beleza e irrealidade que explode de sensações e toques discretos nos fios nervosos, que respiro o resto dos aromas dos tempos quentes, pautados pelas recordações de outros abafados na memória e todos em uníssono me relembram a inquietante presença do fim...