terça-feira, julho 11, 2017

Terça, 11.
Estavam todos reunidos na sala ampla, o jantar terminado. A avó de oitenta anos anunciara que queria revelar um segredo. As filhas, netos e um bisneto olharam-se, apreensivos. Uns, com nervosismo riam, outros, franziam o sobrolho. Eu, amigo da família de longa data, estava presente também. O serão foi decorrendo como era hábito, cada um entregue aos seus entretenimentos. Até que por volta das onze, a velha senhora pediu aos presentes que se aproximassem. Acorreram todos, excitados. Sentada num cadeirão que a vetusta idade e mais os anos de proprietária lhe conferiam, sorriu de um modo misterioso, traçou as pernas como se tivessem vinte anos, e demorou o olhar em cada um dos descendentes como a indagar o que exprimiam os seus olhos. Depois baixou a cabeça, não tanto por vergonha ou timidez, mas para olhar aquele que estava no centro da notícia: “Minhas filhas, netos e bisneto, anuncio-vos que vou ser mãe.” Houve um grande silêncio. De repente, todos ali ficaram mudos, olhando-se sem perceber o que a velha matriarca queria dizer. Foi a neta mais velha que fez a pergunta que nenhum dos outros ousou fazer: “Avó, quem é o pai?” A avó olho-a do fundo da sua imensa ternura e respondeu, rindo: “Mistério!” O que se seguiu, já não assisti porque acordei, olhei o relógio e vi que passava já das sete da manhã – e num pulo pus-me fora da cama.


         - Tendo andado metido em grandes ágapes. A semana passada quase não parei em casa, esta tenho já agendado um almoço de inauguração da galeria de arte do António Segurado, quinta-feira; uma viagem a Vila Viçosa, ao palácio dos Bragança, para rever a biblioteca reunida por D. Manuel II a muito custo, na sexta-feira. A propósito de “ágapes” que eu emprego com frequência, diz Frederico Lourenço que a palavra deriva do grego agápai que à letra traduz “amores” e refere as refeições que os primeiros cristãos partilhavam em conjunto. A forma habitual da palavra em português é masculina, mas ele e Alexandre Herculano, preferem usá-la no feminino: “ágapas”. Eu vou adoptá-la também, porque me parece mais rigolo e de acordo com a festa rigolote que acompanha os ágapas.