Sábado, 8.
Almocei
com os do costume no Sinal Verde mais abaixo do Príncipe onde João Corregedor e
eu não gostamos de comer, no número 42 da Calçada do Combro. Aquele
restaurante, onde não entrava há muitos anos e fora ponto de muitos encontros
quando vivi ao fundo da Rua de S. Marçal mais de trinta anos, está intacto só o
patrão engordou e envelheceu. Depois de o Dão (caro) correr de goela em goela,
exaltaram-se os ânimos e a discussão foi inflamada. Sobretudo entre João e
Carlos, nos opostos, politicamente falando. Mas também entre Guilherme e o
nosso deputado, fechado nas suas simpatias por Putin. No final, abraços e
ameaças “um dia deixo de falar àquele gajo”. Eu intervinha quando sentia que
Corregedor dominava com a sua obsessão a discussão. Até porque em grande parte
estou de acordo com ele embora, desta vez, tivesse de dizer em que é que opto
por Trump, precisando que não concordo com a acção dele no ataque há dois dias
à Síria (já lá vamos).
- Dispersou-se o bando. João,
Guilherme e eu, fomos abancar no nosso bar em frente à Casa dos Jornalistas
onde ficámos até perto das sete da tarde em amena cavaqueira sobre livros,
antigos colegas, a vidinha airada de um tempo feliz apesar da falta de
liberdade e do cadeado nos dentes. A dada altura João lamenta-se: “Outro dia
dizia à Matilde (a mulher) como foi possível ter-me escapado um escritor tão importante
que tu me deste a conhecer como o filho de Thomas Mann!” João é um tipo
curioso, grande leitor, temperamental e excessivo qb como são os tripeiros. Devia
escrever as suas memórias porque atravessou um tempo que lhe passou pelas mãos
e onde esteve participando, convivendo com os gurus da política alicerçada no
patuá. Contou-me ele que uns dois anos antes do 25 de Abril de 1974, foi
mandado pela organização política MDP/CDE a Estocolmo. Olof Palme era o
anfitrião de todo o tipo de libertação e, por isso, recebeu gente de muitos
lados, de Portugal a África. Convergiram para Oslo, os principais líderes que
no estrageiro combatiam ditaduras. Mário Soares e Tito de Morais por Portugal.
João Corregedor levava uma informação ultra-secreta para transmitir a Soares: o
exército estava em marcha com diversas reuniões ao nível das patentes mais
baixas para depor Marcelo Caetano. Os três estão estrategicamente sentados num
banco de jardim. Quando João faz a revelação, Mário Soares levanta-se, fanfarrão,
os braços erguidos e diz: “Oh, oh, isso é impossível!” A cena foi tão canalha,
que Tito de Morais o manda calar e pede a Corregedor que explique
detalhadamente as acções em curso. No segundo encontro que mais tarde tiveram,
Soares mantém-se na desconfiança, mas aí a preocupação maior do futuro líder do
Partido Socialista, era Cunhal: “E Cunhal, e Cunhal?” João Corregedor não
estava ali para falar do chefe dos comunistas e desobriga-se de explicações.
- Evidentemente, João estava fulo
contra a acção militar levada a cabo por Ronald Trump na Síria. Eu também, mas
baseado em outros parâmetros. Acho assustador que um país, seja ele qual for,
vá atacar outro em nome de princípios e objectivos que só a ele diz respeito. Mesmo
que esses princípios sejam humanamente aceitáveis. Se formos por aí, é a
decadência da democracia, dos valores internacionalmente aceites de convívio e
respeito mútuos, a provocação, a invasão pura e simples. A ONU não se fez para
outra coisa senão para evitar conflitos e guerras sangrentas. É, portanto, lá
que os países devem aligeirar os ódios, as malvadezas, e se possível evitarem
as guerras. Em caso de conflitos, é às Nações Unidas que compete dirigir as
operações, sempre no critério da paz. Se Trump procede sozinho, sem dar cavaco,
armado em senhor todo poderoso, é igual a Putin e a outros dirigentes que detêm
o poder para humilharem e transformarem os outros em lacaios.
- Tenho acompanhado as eleições para a
presidência da república em França. Outro dia ouvi Emmanuel Macron. Pobre tipo.
Não passa de uma máquina de ambição e tagarelice. É o delfim do medíocre
François Hollande e isso por si só é desencorajador.
- Também assisti a um espectáculo
miserável na SIC. Dois jornalistas, carregados de dossiers, estão meia hora a
bombardear Passos Coelho numa completa anarquia, manifestamente só para
estenderem ao comprido o entrevistado. Este, sem um simples papel de notas,
responde com conhecimento a todas as armadilhas que os ilustres plumitivos, a
mando sabe lá de quem, lhe fazem. Nem deixam o homem terminar as respostas, logo
o atacam à sorrelfa com perguntas que eles entendem ser sensacionais e não
passam da corriqueira prática do jornalismo bacoco. O arrastão informativo está
a cavar a sepultura deste governo. Pobre país o nosso!
- O Werner enviou-me esta tentadora
foto do seu jardim em Wallisellen, na Suíça. Diz ele que só se chega a esta
beleza, podando três vezes por ano. Decerto. Mas que apetece partir sem demora
para beijar estas obras de arte, lá isso...