Quinta, 13.
A
pouco e pouco, o Mágico vai deixando à mostra os truques que há um ano vem
escondendo. São agora os médicos que avançam com uma greve de dois dias; as
escolas a cair de podre que os alunos rejeitam; a descoberta de que nunca o seu
Governo manifestou interesse em nacionalizar o BES; que cá dentro chamaram tudo
ao camarada socialista à frente do Eurogrupo, mas em Bruxelas acobardaram-se e
nem um pedido de desculpa exigiram, para não falar da propaganda desfiada em
laudas sobre os seus méritos de que se encarregam as televisões e os jornais,
num coro de unicidade confrangedor que envergonha o jornalismo. Indiferente à
magia, as agências de raiting
continuam a chamar à varinha de condão do mestre de cerimónias, lixo.
- Almocei na Adega da Mó com o Carlos
Soares dito o Irmão. Que repasto suculento de sabedoria e conhecimento sobre
Arte em geral e particularmente arte-sacra e escultura dos séc. XV ao XVIII. Ao
ouvi-lo, constatei uma vez mais que a pintura, a escultura, a escrita não é
trabalho para dondocas e dondocos pretensiosos, que se aproveitam da arte para
fins pessoais e caganças promocionais, passando ao largo do estudo, da
aprendizagem meticulosa, da percepção que se adquire com paciência e análise, protegida
por mestres numa viagem fascinante que só a morte suspende. Carlos esteve em
todo o lado onde a aprendizagem estivesse: Paris, Viena, Alemanha, Angola,
Itália, Estados Unidos e passo. Foi contratado por fortunas fabulosas que nunca
lhe interessaram e só ficou o tempo que exigia o saber. Depois levantava amarras
ante a indignação daqueles que despejavam as contas bancárias para o ter perto
deles. Mesmo aqui, trabalha dando apreciações técnicas para a Igreja que não
lhe paga um tosto. Em compensação, o Banco de Portugal, dá-lhe 3 por cento por
cada parecer – mesmo que a peça não seja adquirida. Mas quem o vir, naquele
jeito maltrapilho de trajar, naquela figura desleixada, os olhos azuis que
sorriem mais que o rosto, desprezando a vaidade e as benesses, afirmando que é
de direita mesmo que isso custe ao Corregedor que diz invariavelmente no remate
de uma discussão “vou deixar de falar a este gajo”, ninguém dirá que está ali
alguém com cultura e quase obsessão pela história, que a gratifica com uma
memória fiável a um ponto que não há hesitação, dúvida, quando despeja datas,
nomes, escolas, correntes filosóficas. O Virgílio que foi professor na Escola
de Belas Artes, dizia-me há tempos que tem aprendido muito com ele e ainda que
o João Corregedor não suporte ter por perto gente de direita, nunca se afasta
dele porque o Irmão é na realidade um dicionário fácil e simpático de
consultar. Para mim são ambos bons amigos.