segunda-feira, outubro 06, 2025

Segunda, 6.

Regressaram frescos e combativos, os “revolucionários” compadecidos dos palestinianos. No aeroporto foram recebidos pelos seus adeptos assíduos, os mesmos que invadiram, domingo, a estação do Rossio e fizeram estragos e pelo menos um deles foi para o hospital por ter sido electrocutado num comboio. Dizem que foram muito maltratados, que não dormiram, passaram fome e assim. Mas a gente olha para eles e para os outros de outras nacionalidades que eu observei em estações de televisão internacionais, e não lhe vemos nenhuma marca de violência. A não ser que eles entendam que deviam ser recebidos na prisão com champanhe e palitos la raine

         - Estou a findar a releitura do livro Pascal com textos escolhidos e introdução de François Mauriac. Neste introito, quem se expõe é o autor de Le désert de l´amour. A dada altura diz ele: “Nous ne savons rien de Pascal amoureux, sinon qu´il parlait de l´amour comme quelqu´un qui en a souffert.” Quase me apetecia devolver estas palavras ao seu comentador... Quem conhece o antes e o pós-II Guerra, e conviveu com a plêiade de escritores que se conheciam e frequentavam – Jean Cocteau, Gide, Green, Mauriac, Jean Schlumberger, Robert de Saint-Jean, Gertrude Stein e passo -, sabe que espécie de convívio e sombras existia entre eles, uns mais às claras, outros resguardados pelos mandamentos da Santa Madre Igreja e dos códigos morais-sociais-pequeno-burgueses. O casamento era a fachada que lhes restituía uma certa dignidade moral, e encobria as traseiras onde a multiplicação de amores circunstanciais era o leit-motiv para toda a sorte de escapadelas e mordidelas no matrimónio. Pascal enferma da doutrina que S. Paulo largamente impôs, tendo por centro da vida humana o sexo ou o seu desvio dito natural. Jesus Cristo que nunca se pronunciou sobre o assunto, é para esta hipóstase existencial, o vingador, o que não permite ao homem os prazeres fora do contexto familiar abençoado pela Igreja. Como se todos nós perante Deus, fôssemos apenas a satisfação dos nossos instintos que nos desnorteiam e subjugam. Como se a exclusividade do amor, pudesse sobrepor-se ao desejo que a rua nos oferece e o nosso íntimo reclama. Tudo o que sai deste esquema simples, puro na sua essência desde que aceite no interior de cada um de nós, é ofensa a Deus, é pecado condenado à luz dos cânones religiosos. Depois, seguindo Blaise Pascal, naquela noite em que ele diz ter escutado a voz de Cristo e nos lega as Suas sublimes palavras: “Console-toi, tu ne me chercherais pas si tu ne m´avais trouvé. Je pensais à toi dans mon agonie, j´ai versé telle goutte de sang pour toi... Veux-tu qu´il me coûte toujours du sang de mon humanité sans que tu donnes des larmes?” Impressionante, não é? Contudo, para voltar a Mauriac, subsiste de que podridão de vida padeceu Pascal, que buscas pela satisfação dos instintos que, portanto, nos foram dados por Deus, foram as suas que não ousou revelar-nos, embora padecesse no corpo e na alma, levando-o à morte aos 39 anos de idade e a sua obra fundamental por acabar - Pensées. De duas uma: os “crimes” de Pascal foram cometidos com mulheres ou com homens. A moral e os bons costumes no século XVII, em Paris, não eram propriamente segredo para ninguém e a mulher francesa tanto se deitava com o rei Luís XIV, como com o jardineiro aperaltado e garboso que lhe tratava dos domínios. Restam os homens. Mauriac não ousa ir tão longe, mas deixa nas entrelinhas essa hipótese, pela insinuação da escrita, pela época, pela sua própria vida de que Green e Cocteau, sobretudo este, teriam muito a contar e, porque não dizê-lo, o último não se exibiu de narrar. É verdade que Pascal não centra os seus “pensamentos” somente na comezinha actividade humana da satisfação da sensualidade. Todavia, toda a obra reflecte essa obsessão que ainda hoje impera na Igreja, não obstante muitos dos seus padres, bispos e cardeais, empurrados pelos instintos (lá está) abjuraram dos seus mandamentos sem, contudo, imagino, perderem a fé. Pascal é muito pragmático na escolha dos temas, na exposição dos mesmos e no império religioso que subjaz em cada linha. Esta passagem: Ce n´est pas que mon intention soit de corriger un vice par un autre, et de ne faire nulles estime des anciens, parce que l´on en fait trop.” E vai mais longe: Je ne prétends pas banir leur autorité pour relever le raisonnement tout seule, quoique l´on veuille établir leur autorité seule au préjudice du raisonnement...” A isto chama-se autoridade, não só no tom como na perspectiva. 

         - Mantenhamo-nos em França, na de hoje, governada por Emmanuel Macron. O primeiro-ministro por ele nomeado há três semanas, acaba de apresentar a demissão. Sébastien Lecornu (citado quase sempre como S. Lecornu), disse na despedida que negociar em tão pouco tempo um orçamento, “é tarefa difícil, ainda mais neste momento” e bateu com a porta. A democracia resvala por todo o lado, destruída pela ambição dos partidos e o despudor dos confrontos frequentes nas ruas. É um regime maravilhoso que tende a acabar. Tornou-se demasiado frágil, exposto a todos os crimes, à corrupção que enxameia por todo o lado. Pela parte que me toca, só o refúgio em Deus me dá protecção.