sábado, dezembro 16, 2023

Sábado, 16.

Ontem, depois de sair do médico que confirmou o meu excelente estado de saúde, nada que eu não soubesse sendo uma pessoa atenta ao seu corpo, frugal em todos os aspectos da vida e sensível à mais ínfima perturbação, fui almoçar ao 1800 como sempre simples e bom. Dali subi a Campo de Ourique para vaguear sem destino, de modo a captar o presente invadido pelos franceses, na sua maioria na forma de negócios, mas também no cruzamento de línguas e modo de vida e algum gosto. Inúmeras são as lojas com a marca França: cafés, pastelarias, queijarias, restaurantes, talhos, com particular interesse o espaço Amoreiras Plaza. Se fui em busca do presente, perdi-me no passado. O bairro vizinho do meu (Rua do Salitre, ao Rato), que eu frequentava com regularidade, a moda de irmos tomar café à Tentadora ao sábado de manhã e ao domingo, uma cerveja à noite na cervejaria ao lado, e depois até ao Jardim da Parada a quantidade de amigos que por ali viviam: António Hermano Sarava, António Carlos Carvalho, Francisco George, a Judite, alguns colegas do jornal, a Alzira e tantos outros e outras. Palmilhei o bairro mais de uma hora, observando o contraste do moderno com o antigo, felizmente este grosso modo bem conservado, e o moderno pensado para não ferir o centenário e fui dar à Rua do Sol ao Rato, que desci a pé, parando num prédio escondido para dentro, onde o João Perry viveu e onde eu ia passar uns serões agradáveis com ele e o seu companheiro, um ginasta apessoado, um pouco mais a baixo da casa onde nasceu Afonso Costa. Quando tomei o 727 para a Avenida de Roma ia nostálgico, ensimesmado. Felizmente que parei no Frutas Almeida e o empregado meu conhecido me desviou os pensamentos para as histórias do bairro, prevenindo-me que tivesse atenção aos rapazes com “propostas esquisitas”. Não percebi nada, mas fingi que sim. Ou antes de quem tenho que me precaver é dele... Ai a vida, a vida! 

         - Esta manhã estive meia hora a decapar o gelo do carro. Parecia que tinha caído neve durante a noite. Com efeito, depois de uma semana sem acender a lareira, ontem retomei esse acolhedor hábito. Duas horas de escrita pouco proveitosas. É assim a vida de quem se martiriza pela escrita. Para longe, muito longe a sensaborona e rotineira vida dos políticos manhosos. Estou-me nas tintas para quem vai ganhar a liderança do PS. A rapariga de caixa do supermercado, perguntou-me em quem devia votar, respondi vote em quem lhe trouxe felicidade e alegria de viver. Rindo-se: “ninguém”.