quarta-feira, dezembro 13, 2023

Quarta, 13.

Comecei as quatro primeiras horas do dia e ler os 48 Ensaios de Virginia Woolf editados pela Relógio D´Água e as duas últimas no romance. Que me correu melhor que ontem, tendo avançado página e meia. Se conseguisse este ritmo diário, terminaria a obra a meio do próximo ano. Mas...

         - Hoje voltou a falar-se muito da semana de quatro dias de trabalho. Não sei se é para puxar por algo feito pelo governo PS, se para abrir caminho à modernidade que comanda a ociosidade numa altura em que o trabalho (ou a falta dele) está pelas ruas da amargura. Como disse atrás, devo ter sido o primeiro a incentivar esta organização laboral. Fi-lo em 1985 no começo do Verão e estendi-a até quase ao fim daquele ano. A experiência que tive foi desoladora. Porque uma empresa é como um puzzle que funciona agarrada ao todo. Como a Esfera Publicidade era a única que trabalhava neste contexto, depressa os seus clientes começaram a debandar porque não tinham resposta na hora aos problemas que urgia resolver. Alguns chegaram-me a dizer que eu era mais poeta que director empresarial. Daí, a pouco e pouco, foi ficando dentro da empresa um ou dois empregados para assegurar o que viesse. Todavia, as evidências estavam à vista: o método só podia operar, se todos os nossos clientes fizessem o mesmo. As regras do jogo foram alteradas apenas num dos lados e, evidentemente, a máquina começou a emperrar. 

Embora hoje com as modernas ferramentas que nem sempre agregam ideias e métodos de trabalho à distância, sou, contudo, levado a aceitar que algo mudou ou pode mudar desde que a sociedade encare o trabalho irmanado com a justiça social. O que temo, para ser franco, é que a generalização deste método, vá criar ainda mais injustiça, técnicos ricos a par de escravos sem poder nem conhecimentos no uso das novas tecnologias. Os nobres que manejam algoritmos, câmaras acopladas para reuniões à distância, e toda essa parafernália de saber que acompanha a IA, se transforme numa afronta à outra metade da população analfabeta e sujeita a treze horas de trabalho diário como foi o caso dos condutores de pesados. Sem falar na urgência de mais trabalho. O país ficou parado nestes últimos oito anos, o desemprego cresceu embora haja muita artimanha a dizer que foi erradicado do tecido social. Só com trabalho podemos sair desta condição de pedintes, a viver de esmolas enquanto país da UE e enquanto povo do Estado. Não há riqueza, não há desenvolvimento industrial e científico, mas pode haver estas fantasias de esquerda: uns a trabalhar quatro dias por semana e os demais 9, 10, 11, 12 horas/dia. Temos os governantes que temos, mas encaremos de vez a realidade: esta gente pensa nos seus interesses, são elites mafiosas que vive num casulo de cumplicidade e honrarias, corrupção e indiferença pela dignidade dos seus concidadãos. E não me alongo mais. Ainda que vislumbre ao longe uma psicose do tempo vazio a invadir as vidas tristes dependentes da indústria disto e daquilo, ansiolíticos e mezinhas que atenuem o forçado e decretado dolce far niente.