sábado, setembro 12, 2020

Sexta, 11.
Não me sai do coração a aflição dos 13 mil refugiados de Lesbos ao verem o campo-prisão a arder. Muitos milhares desapareceram, outros foram transferidos para o continente grego, muita criança em sofrimento não percebendo o que estava a acontecer. Esta triste imagem, é a cara da UE estampada dos destinos de milhões de deslocados, da sua indiferença face ao drama dos outros, seus ou não. Os que foram encontrados ou em fuga, estão armazenados em navios até que um novo centro seja construído. A desumanidade é o rosto de uma organização construída para que a máquina infernal de produzir riqueza seja glorificada em detrimento dos seres humanos que em primeiro devia proteger.

- A Maria Luísa telefonou a dar-me os parabéns pelo meu aniversário. Forma de falar, porque o que me disse foi “prepara-te porque isto já está por pouco” e para a filha: “Gi, arranja uma pistola e dá-me um tiro, já cá não ando a fazer nada”. Está choné a minha boa irmã.

- Portugal há dois dias teve mais de 600 novos casos de coronavírus – resultado do querido turismo. Entretanto, a partir de 15 deste mês, o país entra em “situação de contingência” com regras que praticamente não bulam com os negócios. Felizmente que Costa não cedeu às pressões dos corruptos do futebol e continuam os estádios fechados com os profissionais a jogarem como miúdos entre si. Mas a coisa está preta por todo o lado. A França somou mais 9 mil casos; Espanha mais 10 mil; Brasil 33 mil; EUA 37 mil tudo isto no dia de ontem.

- 18,04. Meia hora de vigorosas braçadas depois da tarde consagrada à leitura (São Paulo, jornais, outras mais). Interessa-me particularmente o século dezanove português por tudo quanto ancorou ao século XXI. Sobretudo a história dos dois irmãos D. Miguel I e Pedro IV. O primeiro belo, libertino, sensual; o segundo frágil, feio, mas temperamental. Ambos dependentes do sexo, com filharada dita ilegítima, os dois subordinados ao temperamento forte da mãe, Carlota Joaquina, irmã do rei D. Fernando VII de Espanha. Ela é pouco referida nos artigos que o Público tem vindo a publicar e, todavia, foi ela que manobrou D. Miguel nas suas loucuras contra o irmão, incentivando-o a restaurar o absolutismo, a Constituição e assim. D. João VI foi um rei fraco e não obstante os seus nove filhos, o casamento foi uma desordem. Eu gosto particularmente deste período, porque acho que foi a partir dele que elementos aparentemente desconexos, trabalharam para a restauração da República (pelo meio com aquele absurdo de duas Constituições: brasileira e portuguesa) e para que o país tivesse, por fim, a Constituição de 1822.

- Terminei A Lição do Sonâmbulo de Frederico Pedreira. Ou antes não quero ausentar-me tão depressa de uma obra extremamente bem construída que me arrebatou logo no primeiro capítulo. Ficarei por mais uns dias a reler certas passagens e a saborear a arte de bem escrever, completamente apartada da mediocridade de quase todos autores da nova geração (sobretudo no conteúdo, já agora). Disso me ocuparei quando rasgar (desde o início) um grande elogio ao último trabalho de Frederico Pedreira.