quarta-feira, setembro 09, 2020

Quarta, 9.
Embora o dia devesse ser de serenidade, bom repasto, soneca e omissão total, coube-me andar atrás da renovação da Carta de Condução cujo prazo terminava hoje. Assim, como é habitual, fui à escola de condução onde tirei a respectiva licença há 400 anos, ao Rato, e deparei-me com uma fila de gente na rua. Não invoquei os meus direitos e só ao fim de mais de meia hora, pude entrar na loja para ser observado por uma médica muito jovem que se surpreendeu com o meu aspecto “sólido”. “Que toma? - Champanhe e como caviar.” – Falo de medicamentos. – Nada. – Nem para a tensão, colesterol... – Nada.” Olhou-me com surpresa e acrescentou: “De facto, o senhor tem aspecto bem saudável.” Não respondi ou antes disse para os meus botões: “Passa para cá a carta e deixa-te de salamaleques...”

         - O engraçado aconteceu com um rapaz que deveria começar as aulas de condução. A empregada pergunta-lhe os seus dados e a dada altura a morada. Ele gagueja, diz que não se lembra onde mora. “Então como quer que eu preencha a ficha se não sabe onde habita!” Concentra-se o jovem por sinal uma beauté, e ao cabo de minutos diz o nome da rua. “Tem a certeza?” Ele acena que sim com a cabeça. “Número da porta?” Atrapalha-se de novo e diz que não sabe, está visivelmente perturbado. “Então como posso eu enviar-lhe os documentos?” “Eu costumo entrar pelas traseiras”, diz com sinceridade. Segue-se um longo impasse, a funcionária insiste, espanta-se com a resposta, desconfia, por fim ele tira do bolso dos calções o telemóvel, pesquiza, pesquiza uns largos minutos no aparelho e soletra o número da porta. “Andar?” quando ela pensa que vai acontecer outro hiato, ele responde in petto: “Segundo, direito.” A rapariga abriu muito os olhos e sorriu.

         - No restaurante disse ao empregado que se ufanava em matar o coronavírus pulverizando as mesas com desinfectante: “Que trabalho o vírus chinês lhe dá! - Eu quando vejo um chinês só me apetece devorá-lo! Não diga isso – atalhei – os chineses não têm culpa. O ditador Xinping ping ping (dou mais uma) ping e o exército e o Comité Central do partido é que são os obreiros desta pandemia.”

         - Magnífico o número especial da Paris Match consagrado a De Gaulle. Quem me dera que os políticos actuais se aproximassem em honestidade, competência, dedicação à causa pública e verticalidade ao homem que lutou para libertar a França das patas nazis! Não há ninguém que se lhe compare, nem antes dele nem depois. Os franceses só há poucos anos é que deram conta disso.

         - Descobri a razão pela qual este ano, apesar do intenso calor, não haver quase moscas e mosquitos: os tratamentos (pelo menos uns quatro ou cinco desde o início do ano) à vinha do meu vizinho. Não têm cheiro e há uma certa distância daqui da casa; mesmo assim, sempre que vejo as máquinas, fecho portas e janelas.


         - Quando um empregado de café vos diz “o senhor é um amor” temos tendência a interpretar a lisonja como sendo um convite à dança; mas se esse empregado for africano e trouxer a todo o comprimento do braço tatuado o nome da filha, percebemos que se trata do reconhecimento que somos simpáticos e gentis para com ele.