Quarta, 9.
Embora
o dia devesse ser de serenidade, bom repasto, soneca e omissão total, coube-me
andar atrás da renovação da Carta de Condução cujo prazo terminava hoje. Assim,
como é habitual, fui à escola de condução onde tirei a respectiva licença há
400 anos, ao Rato, e deparei-me com uma fila de gente na rua. Não invoquei os
meus direitos e só ao fim de mais de meia hora, pude entrar na loja para ser
observado por uma médica muito jovem que se surpreendeu com o meu aspecto
“sólido”. “Que toma? - Champanhe e como caviar.” – Falo de medicamentos. –
Nada. – Nem para a tensão, colesterol... – Nada.” Olhou-me com surpresa e
acrescentou: “De facto, o senhor tem aspecto bem saudável.” Não respondi ou
antes disse para os meus botões: “Passa para cá a carta e deixa-te de salamaleques...”
- O engraçado aconteceu com um rapaz
que deveria começar as aulas de condução. A empregada pergunta-lhe os seus
dados e a dada altura a morada. Ele gagueja, diz que não se lembra onde mora.
“Então como quer que eu preencha a ficha se não sabe onde habita!” Concentra-se
o jovem por sinal uma beauté, e ao
cabo de minutos diz o nome da rua. “Tem a certeza?” Ele acena que sim com a
cabeça. “Número da porta?” Atrapalha-se de novo e diz que não sabe, está
visivelmente perturbado. “Então como posso eu enviar-lhe os documentos?” “Eu
costumo entrar pelas traseiras”, diz com sinceridade. Segue-se um longo
impasse, a funcionária insiste, espanta-se com a resposta, desconfia, por fim
ele tira do bolso dos calções o telemóvel, pesquiza, pesquiza uns largos
minutos no aparelho e soletra o número da porta. “Andar?” quando ela pensa que
vai acontecer outro hiato, ele responde in
petto: “Segundo, direito.” A rapariga abriu muito os olhos e sorriu.
- No restaurante disse ao empregado
que se ufanava em matar o coronavírus pulverizando as mesas com desinfectante:
“Que trabalho o vírus chinês lhe dá! - Eu quando vejo um chinês só me apetece
devorá-lo! Não diga isso – atalhei – os chineses não têm culpa. O ditador
Xinping ping ping (dou mais uma) ping e o exército e o Comité Central do
partido é que são os obreiros desta pandemia.”
- Magnífico o número especial da Paris Match consagrado a De Gaulle. Quem
me dera que os políticos actuais se aproximassem em honestidade, competência,
dedicação à causa pública e verticalidade ao homem que lutou para libertar a
França das patas nazis! Não há ninguém que se lhe compare, nem antes dele nem
depois. Os franceses só há poucos anos é que deram conta disso.
- Descobri a razão pela qual este ano,
apesar do intenso calor, não haver quase moscas e mosquitos: os tratamentos
(pelo menos uns quatro ou cinco desde o início do ano) à vinha do meu vizinho. Não
têm cheiro e há uma certa distância daqui da casa; mesmo assim, sempre que vejo
as máquinas, fecho portas e janelas.
- Quando um empregado de café vos diz
“o senhor é um amor” temos tendência a interpretar a lisonja como sendo um
convite à dança; mas se esse empregado for africano e trouxer a todo o
comprimento do braço tatuado o nome da filha, percebemos que se trata do
reconhecimento que somos simpáticos e gentis para com ele.