segunda-feira, setembro 28, 2020

Segunda, 28.

Tant bien que mal, eis-me de novo em contacto regular com os meus leitores. Esta ideia, partiu do facto de ter havido suspensão na publicação do Diário. Estão editados três volumes e desde o primeiro nunca mais deixei de trabalhar nesta forma literária pouco usual em Portugal. Contam-se pelos dedos duma mão, os escritores que mantêm regularmente o registo íntimo dos seus dias. Talvez isso se deva a muitos anos de ditadura e ao facto de não estarmos habituados a falar livremente. Somos muito sensíveis e prezamos estupidamente a nossa vida íntima, como se quem somos se purificasse recolhido em nós. Os franceses, ingleses e alemães são mais dados à descoberta de si e do mundo que os rodeia. É também uma questão cultural, de liberdade, de estar no mundo olhando-o ao espelho da nossa alma.  

          - Ontem na Brasileira, durante duas horas e meia de trabalho, escrevi página e meia no Matricida. À minha volta o ruído era muito, mas eu sentia-me como se estivesse numa ilha isolada. Com uma mesa de intervalo da minha, dois homens de uns trinta anos, falavam incansavelmente de “motas”. Mas o que eu percebi foi que o tema não passava de um engate velado que nenhum deles assumia. 

         - O mundo atingiu um milhão de mortos por coronavírus. Aterrador. 

         - O Ministério Público acusa os inspectores do SEF da morte do ucraniano Ihor Homenyuk, assassinado no aeroporto de Lisboa, no dia 12 e Março deste ano. Enfim, enfim! Eu indignei-me aqui na altura e é portanto com satisfação que vejo a condenação dos energúmenos: Luís Silva, Bruno Sousa e Duarte Laja. Os três exerceram sobre o imigrante pacífico, tortura que o levou à morte: amarram-no com fita cola e lençóis, nos pés e tornozelos, bateram-lhe com um bastão metálico, deram-lhe pontapés e Duarte Laja com um pé em cima da cabeça à moda americana (os assassinos costumam ver muitos filmes americanos), embateu-a com força deixando-o a urinar e foram descansados à sua vida. Voltaram no dia seguinte, entraram folgazães e ante a evidência do crime, disseram à segurança: “Os nossos nomes não é para constarem aí, nós não estamos cá.” O corpo é enviado ao Instituto de Medicina Legal com a informação de que havia sido encontrado na via pública. O médico legista porém, não teve dúvida – tratava-se de um homicídio. Um pormenor mais: Duarte Laja, depois de terem malhado na vítima indefesa, desabafou: “Isto hoje, já nem preciso de ir ao ginásio.” Espero que tenham 20 anos de prisão.