Domingo, 18.
Estou
quase no fim do ensaio do Príncipe, Novos
Estudos Sobre António Sérgio. Longa peregrinação sobre um trabalho que está
longe de ser nulo, mas que padece do eterno problema das nossas universidades: demasiado
obscuro. Apetecia-me dizer o que disse Madame du Deffand a Horace Walpole sobre
a música de Gluck: La musique de Gluck
n´est ni française, ni italienne. Je doute que les savants puissent la louer de
bonne foi; et pour les ignorants comme moi, ele n´est plus qu´un charivari
tantôt bruyant, tantôt plat et toujours ennuyeux. Bom. Eu não chego a
tanto. Príncipe tem dois capítulos onde se estende na exigência de filósofo que
me parece estar longe de ser a sua. Muitas são as páginas em substância como no
português que é o seu, me paralisaram ao lê-las. Dou um exemplo. Nos textos dos anos de 1930, surgem
destacadas teses que são axiais no seu platonismo ideal, e que mostram porque
AS (António Sérgio) insistiu na
espontaneidade e na organicidade do intecto e na anterioridade do todo em
relação às partes no psiquismo humano, para o que se apoiou (também) em
leituras sobre psicologias da totalidade que rejeitam o atomismo dos dados da
percepção; AS (António Sérgio) distinguiu
o pensamento do discurso em que se manifesta e sublinhou o aspecto
realista-idealista de feição platónica e espinosista do seu ideário que postula
a existência de uma inteligência imanente ao Cosmos. Ufa! Que mente mais entaramelada! Coitados dos
alunos que hoje frequentam as universidades! Não queria estar no seu lugar.
Parece que em Portugal um pensamento sólido tem antes que passar pela
inacessibilidade da escrita, sem a qual nenhum pensar consistente merece a
gratidão da originalidade e da profundidade. É-se inteligente, denso, original
quando botamos palavreado caro que impressiona e põe em sentido os incultos. O
gueto universitário, constrói-se de distância e desdém.
- Seis milhões de pessoas assistiram à
missa celebrada em Manila pelo Papa Francisco. À sua chegada ao Sri Lanka disse
que “a liberdade religiosa e a liberdade de expressão são ambos direitos
fundamentais” e acrescentou: “Não se pode matar em nome de Deus. Matar em nome
de Deus é uma aberração.” Todavia, não deixou de prevenir os jornalistas “não
se pode provocar, não se pode ridicularizar a religião dos outros”. E para que
fosse mais claro, disse: “Ainda antes de eliminar seres humanos em assassinatos
horríveis, o fundamentalismo religioso elimina o próprio Deus, transformando-O
num mero pretexto religioso.” Não sei se os jornalistas compreenderam. Para mim
nós devemos respeito recíproco a cada religião e, portanto, deve haver extremo
cuidado em não fazer de Deus um fantoche que passa de cartoon em cartoon numa
disputa a ver quem melhor o achincalha e com isso vende mais jornais. Dito
isto, acho que a capa do número especial do Clarlie
Hebdo foi muito cuidada e reflectida e por si só é um imenso perdão àqueles
que mandaram assassinar os jornalistas do jornal.