Sábado, 26.
Às oposições tudo serve para chicana política. Fervorosos defensores dos imigrantes, piedosos das suas ideologias sem contrapartidas nenhumas, dizendo-se dignitários protectores daqueles que procuram uma vida melhor entre nós e depois deixam-nos pelas ruas da amargura, dormindo e vivendo miseravelmente, sem respeito e dignidade, tudo aproveitam para se gloriarem de um humanismo de pacotilha, de corações endurecidos pelo radicalismo e sectarismo de que deram provas estes dias no Parlamento. Aquele espectáculo é digno do mais putrefacto e vil que à sombra da democracia nos é dado assistir. O vandalismo é para as suas obsessões a possibilidade, o trampolim que encarcerariam se chegassem ao poder. Tenham ou não razão os que se indignam pela morte do infeliz às mãos de um jovem polícia na noite de quarta-feira no Bairro da Cova da Moura, perdem-na quando misturam a raiva e o desespero e atentam contra a liberdade de milhares e destroem bens públicos e privados em actos de criminalidade impossíveis de aceitar em qualquer regime político.
- Já não falta muito para sabermos quem ganhará as eleições nos Estados Unidos da América. Chamemos àquilo democracia. Ou antes, digamos que ela só imperará, se o dinheiro às mancheias for injectado no sistema dito democrático. Não vale a pena chorar no molhado. Quando o maior milionário do mundo, Sr. Elon Musk, oferece um milhão de dólares por dia num sorteio a quem votar em Trump, temos a ruína da democracia diante dos nossos olhos estupefactos, temos a democracia reduzida a um qualquer produto. Como foi possível chegar até aqui? Perguntem à ganância daqueles que querem o poder pelo poder.
- Toda a gente exige somas fabulosas para fazer face ao custo de vida, não se perguntando onde vai o Estado buscar o dinheiro necessário à satisfação desmedida de todos os sectores. O nosso país é pobre, a riqueza está nas mãos de uns quantos, o solo não produz coisa que se veja, não temos matéria prima de relevo, e assim o dinheiro que o Estado possui chega-lhe em pescadinha no roulement dos impostos. Por agora o turismo vai sendo a mina de ouro. Não é, todavia, certo que o jazigo não seque. No sistema capitalista em que nos encontramos, tudo o que os governos ofereçam, a inflação vai por trás e rouba. A nossa sociedade, mesma em democracia, não é equilibrada. Uns tudo fazem para a perverter convencidos que na podridão podem tomar o poder; outros instalam-se e chamam ao seu umbigo o mealheiro da riqueza subtraída por manigâncias ínvias.
- Ontem, quando descia o Chiado, numa manhã tépida de sol tímido, em passo lento, experimentei o suave encanto que me imbuía de alegria. Foi um momento indiscritível, uma espécie de bênção descida do alto, a sensação de pertencer àquela artéria da cidade desde tempos imemoriais. A minha história pessoal funde-se com aquele lugar, pois desde muito cedo ali parava, ali perto trabalhava, ali aprendi os valores da liberdade ouvindo este e aquela, artistas com quem me cruzei que sem ser esse o seu objectivo escolheram-me como mensageiro de protestos e denúncias que ainda hoje carrego. Estas páginas e os livros publicados e escritos, são disso testemunho.
- Igualmente ao serão, depois do noticiário, afundado no sofá do salão, o silêncio cirandando por todo o lado, a noite aberta lá fora, as estrelas espreitando cá para baixo, senti em mim uma paz profunda como há muito não experienciava. Rodeado de livros, peguei no Somerset Maugham e envolvido no romance, esqueci as horas. Ao aproximar-me das 150 páginas, ouvi o relógio que está por cima da lareira bater meia-noite. Só então me despedi das personagens e do espaço mágico onde estivera submerso por um tempo sem tempo.