Quinta, 2 de Janeiro.
A vida está sempre a dar-nos a lição que se fôssemos inteligentes açambarcaríamos em definitivo. É o caso do treinador do Sporting, pessoa que estimo sem perceber patavina do seu trabalho, mas deixo-me arrastar por uma certa moral e arte de viver que ele imprime em tudo o que faz. Não é um gajo qualquer, é alguém que está centrado numa deontologia que o futebol não conhece, e faz da sua estreita presença com os jogadores na sua maioria uns pobre coitados, muitos até patetas de todo, uma filosofia orientadora não só para arte do desporto como para a vida. Acontece que os milhões e a fama devem-no ter sacudido do quotidiano equilibrado, e vai daí, deixando para trás uma multidão de fervorosos de adeptos a chorar, chega a Inglaterra para fazer frente aos sucessivos desaires de um clube local. Passaram dois meses sem vitórias, e aquele que aqui era levado em ombros, lá está na iminência de regressar ao seu canto natal com o rabo entre as pernas. Quem tudo quer...
- O grande palrador nacional, botou mensagem de Ano Novo. O enorme desastre deste nosso infeliz país, é que os políticos falam muito e quem fala demais faz pouco e diz muitas asneiras. É neste caos de tagarelas que nos vamos afundar mais um ano.
- Pois. O que nos espera o 2025 ficou patente na quantidade de pessoas assassinadas. Só em Nova Orleães foram pelo menos uma dúzia, para não falar noutras partes do mundo como, por exemplo, Montenegro, Ucrânia, Faixa de Gaza.
- Este Natal e fim de ano, fui um felizardo. Muitos foram os amigos que me telefonaram. Annie e Robert, o Nam, a Alzira, o Tó (que sendo médico nenhum tempo lhe sobra para os amigos), o Francis eterno defensor da causa homossexual, que do alto dos seus 85 anos me disse ir passar o reveillon “chez les homos”, a Alice, a Gi, Frei Hélcio e o marido, a Michel e não sei quem mais porque a bebedeira entontece.
- Como é meu hábito e desmedido prazer, passei a manhã de ontem diante do televisor. Primeiro, a missa transmitida do Vaticano e a bênção urbi et orbi do Papa Francisco, lúcido, embora entorpecido dos membros inferiores; de seguida o Concerto de Ano Novo transmitido de Viena de Áustria, da sala que guardo as mais vibrantes recordações. O maestro Riccardo Muti dirigiu a orquestra, ele que é já peça do mobiliário de tantas vezes ter orientado a orquestra. Apesar da idade, embora um pouco mais lento de movimentos, pareceu-me ter dado um cunho pessoal a algumas daquelas peças musicais, sobretudo as dos familiares do pai Strauss. (Enquanto escrevo, tendo em fundo uma das suas valsas.)
- Apesar de dorido do lado direito lombar, que o Tó me recomendou tomar três Ben-u-Rons por dia e eu logo barafustei “pitié, pitié Tó, dois chegam”, não deixei de ir a Lisboa e de prosseguir aqui o rapa erva em frente à casa. Encontrei-me com o João Corregedor na Brasileira como é nosso hábito, e dali ele levou-me ao Marquês de Pombal para que eu obtivesse o cartão de circulação grátis para coxinhos, coitadinhos. O João é o meu mestre em transportes públicos, sabe todos os itinerários, todos os guichés onde tratar de assuntos, ele que sempre os usou mesmo quando tinha direito a carro de Estado com motorista à porta de casa. Esperou por mim enquanto eu me debatia com as funcionárias, preenchendo um questionário pidesco, para no fim, surpresa!, não haver passe algum gratuito para deficientes – como tinha lido nos jornais. Ou antes o passe habitual de 20 euros, ficava agora reduzido a 10 euros! “Nada mau – diz-me a empregada ante o meu espanto – porque nós temos de pagar os transportes públicos, à parte o metro onde trabalhamos!” Não percebi a comparação, mas, pensando bem, o que a criatura queria era gratuitidade enquanto funcionária do metro nos comboios, autocarros, etc.. Os sindicatos, os ministros e os organismos públicos, deviam passar por estes momentos para perceberem a realidade em que o funcionalismo público se encontra e as respostas que o cidadão aguenta.
- No princípio do ano não explodem só foguetes e petardos de luz, também estoiram decisões do tribunal como esta de as quatro hospedeiras da TAP que levaram a companhia à judicatura por as haver despedido em 2021 quando da epidemia da Covid-19. O resultado do parecer vai decerto fazer jurisprudência e a TAP vai ter que indemnizar pelo menos 1200 tripulantes que não viram os seus contratos renovados sob pretexto da cobra, isto apesar de a empresa ter adquirido na mesma altura novos aviões. Não vejo citado o nome do grande obreiro deste atentado aos direitos dos trabalhadores, mas lembro-me de na altura me ter insurgido nestas páginas, contra a prepotência de um tal ministro chamado Pedro Nuno dos Santos com o cognome de Vasco Gonçalves.