sexta-feira, maio 31, 2024

Sexta, 31.

Escrevo estas linhas ao fundo da Brasileira, sentado nas mesas que me permitem olhar a esplanada a abarrotar de turistas, ao lado de duas chinesas que parecem portuguesas no seu modo de falar atroador. Acabou de me falar o João a declinar o almoço porque está com 39 de febre devida à famosa vacina que é suposta aumentar saudavelmente a vida dos velhos. É por estas e por muitas outras que eu não me vacino. Para falar verdade, desconfio da humanidade dos laboratórios que ganham milhões por mês a vender saúde falsificada. 

         - A política hoje é uma fera hedionda que morde quem se aproxima. Tome-se o exemplo do México onde vários candidatos às eleições locais foram atacados e pelo menos dois assassinados. Por cá ainda não chegámos a tanto, mas para lá caminhamos. O espectáculo degradante a que se assiste, é mais uma explosão de ódio que o contributo para a harmonia do todo.  

         - Na Índia os termómetros chegaram aos 52 graus centígrados. Há mortes e pessoas causticadas com a vida virada do avesso devido ao aquecimento climático que hoje tem tantos sabichões a combatê-lo e virou filosofia que uns e outros apregoam enterradas as ideologias do princípio do século passado.   

         -  O Diário de Marcello Mathias, é um cemitério. Cada página um óbito, cada linha uma lágrima perdida nos intermezzos das recordações dos que ficaram. 

         - Uma amiga conta-me que um seu amigo que eu conheci, andaria hoje pelos setenta e poucos anos, lhe havia telefonado segunda-feira à noite, mas ela já cheia de sono, decidira não atender tendo-o feito no dia seguinte. Atende o filho que a informa que o pai tinha falecido terça-feira. Este nosso amigo, depois de um casamento para fugir às convenções sociais, conhece no facebook um brasileiro com quem se relaciona durante seis meses, com idas ao Brasil e vindas do rapaz a Lisboa. Ao fim desse tempo, os dois decidem viver juntos. Ele arranjou trabalho cá e vivia com o falecido há cinco anos. Foi o rapaz hoje com trinta anos, que ao chegar a casa dá com o namorado morto na casa de banho. Toda a morte é um mistério, sobretudo quando precede de um aceno adiado. 


quarta-feira, maio 29, 2024

Quarta, 29.

País sui generis e surpreendente o nosso. Temos 17 partidos a tentar ganhar o Euro Dreams de Bruxelas, o tal que dá milhares “mês sim, mês sim”. Isto para apenas 21 lugares ou  seja tantos os números da sorte grande. Eu aposto tudo no IL do rabinho liberal, assim como assim... 

         - Contei ontem quantos foram os países a exercer presença nas Nações Unidas que reconheceram o Estado de Israel: 145. Portugal, importante como é, onde cada gesto e cada palavra conta na cena internacional, não consta no quadro. De tão medíocre e mesquinho, espera que outros o façam para ir a reboque. E contudo, alegretes e pobretes.  


terça-feira, maio 28, 2024

Terça, 28.

Pelo menos 45 inocentes foram consumidos pelas chamas devido aos bombardeamentos aos campos de refugiados palestinianos em Rafah. O assassino Netanyahu diz tratar-se de “um infeliz acidente”. A comunidade internacional, protestou exigindo mais uma vez o cessar fogo na Faixa de Gaza e o fim do genocídio palestino. Tudo em vão, quando Israel tem nas costas os Estados Unidos a sustentar a máquina de guerra e na frente a hipocrisia diplomática peculiar da arrogância típica da administração americana. 

         - Na fanfarra dos partidos a alcandorarem-se à lotaria de Bruxelas, há um que se destaca na pessoa do seu dirigente, senhor Vasco Gonçalves. O homem tem lata e descaramento para tudo, até para acusar os adversários de fazerem propaganda e, imagine-se, haver modificado o tom de voz, arrastando-o como pedindo piedade e compreensão. Ele e o seu secretário-geral senhor António Costa, agora em bicos de pés para se ver omnipresente no cargo da presidência do Conselho Europeu. Dizem que é uma função absolutamente traçada para sua excelência, porque não há nem nunca houve um político tão astuto como ele. Alguns dizem mesmo que é um animal político (curiosamente também disseram outro tanto do gatuno, senhor José Sócrates, seu amigo). De resto, ele mesmo nos informou disso, ao afirmar inúmeras vezes quando foi primeiro-ministro que a ele cabia traçar a política e aos seus ministro pô-la em prática. Só que os oito anos da sua prática deram naquilo que todos sofremos na pele e o actual Governo tem a enorme tarefa de desfazer por aldrabada, selectiva, contra os mais necessitados e o aumento da pobreza para não falar na rebaldaria em que vivemos. Pôr um homem destes num cargo importante como o que ele ambiciona, é traçar para os próximos anos  um tempo de incertezas e desarrumo. 

         - O Papa Francisco assustou a cúpula da igreja católica quando se manifestou contra a entrada de homossexuais nos seminários neste termos: “Já há demasiada bichice (“C’è già troppa frociaggine”). Acontece que o termo “frociaggine” é muito ofensivo para a comunidade gay. Então, hoje, veio a correcção: “frociaggine” não quer dizer bichas...  Se não me engano, em tempos, Francisco já havia dito que os seminaristas recorrem muito à internet para se satisfazerem sexualmente. 

         - Zelensky chegou a Portugal depois de ter estado em Espanha e na Bélgica. Espanha ofereceu-lhe uma almofada robusta de ajudas. Portugal só pode dar-lhe os repentinos estados de espírito de Marcelo Rebelo de Sousa e pouco mais. Não obstante o muito que tem dispensado aos milhares de ucranianos que entre nós se refugiaram fugindo da guerra. O que será feito de dois ou três ucranianos, pessoas incríveis, um padre ortodoxo e o pai, que aqui trabalharam. E paz a outro, o Roman, que faleceu.  


segunda-feira, maio 27, 2024

Segunda, 27.

Ontem, ao vir da missa das nove horas, logo à entrada do super, fui barrado por três jovens simpáticos que me convidaram a comprar qualquer coisa para os pobres e sem-abrigo. Aceitei o saco que me estenderam e quando o restitui disse que não concordava com aquele esquema social que dava a ganhar muito ao Estado através do iva e aos supermercados. Participei porque sei que há dois milhões e meio de pobres e louvo a iniciativa da Senhora Isabel Jonet. Depois, no telejornal, vi que Marcelo também se juntou a acção não porque a coisa o atinja, mas porque apostou na governação trolaró que é a sua. De contrario, não se teria recandidatado ao segundo mandato presidencial, até porque ele próprio havia dito que se não retirasse das ruas a imagem indigna de seres humanos a viver na indigência, não aceitaria outros cinco anos de presidência. À sua maneira roeu a corda – a vida airada é melhor que a solidão para a qual  não  fora traçado. 

         - Passei o dia todo a ler. Tenho um calo no pé direito – aquele que puxa pelo outro – e me provoca não só dificuldade em andar como me causa muitas dores. Fui à farmácia e saí com uma pomada-antibiótico e pacotinhos de gaze. Agora ao fim do dia parece-me estar a melhorar. Gosto de estar só, mas não suporto que as circunstâncias da vida me obriguem ao sedentarismo e ao isolamento. Sou um solitário cercado de gente.


domingo, maio 26, 2024

Domingo, 26.

O Parlamento está transformado numa arena de feras. Parece que pelos Passos Perdidos, os deputados do Chega chamam tudo o que há de mais obsceno às senhoras deputadas doutros partidos e até aos adversários masculinos não poupam com epítetos obscenos. Fazem-no quando as encontram sós, de modo que possam continuar as acusações e a travestirem-se de santos acossados pela ira da oposição. Que tem sido a principal força da sua força eleitoral. Um arroto de André Ventura vale mais do que as sessões laboriosas dos partidos de esquerda. 

         - “A história da Europa comunitária é hoje, quanto ao essencial, a narrativa de um falhanço a que o actual fenómeno das migrações, pela sua inesperada amplidão, veio dar a machadada final.

Tudo por junto, o que se tem vindo a verificar por parte da maioria dos povos que compõem as nações europeias é a progressiva rejeição de determinada configuração política (de que o Tratado de Lisboa é emblemático exemplo) imposta pelos sábios de Bruxelas e meia dúzia de políticos apressados, à revelia as mais das vezes desses mesmos povos.” Quem assim fala, é o nosso embaixador Marcello Duarte Mathias no seu diário, A Desoras, pág. 60. 

         - Curiosamente, eu, não ando tão incrédulo quanto à UE como andei anos a fio, quando éramos tratados por povo gastador, pouco trabalhador e feliz debaixo das quatro estações solheirentas do ano. Quem desbloqueou em mim essa descrença quando se impôs por todos nós aos mandões capitalistas de Bruxelas, foi Mário Centeno. Foi ele que forçou a dignidade do pequeno povo nos limites da Europa ao bater o pé com competência a Wolfgang Schäuble. 

         - Eu sou dos pensam que as esquerdas são provincianas, conservadoras e burguesas, mas quem põe o ponto final em tudo quanto tenho dito sobre elas, é João Miguel Tavares há dias no Público: “A esquerda adora o povo – só lhe falta confiar nele.”    

         - Tempo lindíssimo, tarde quente sem ferir, felicidade por viver no campo cheio da energia que a cidade rouba a quem nela habita. Vou ver e ouvir a ARTE no seu tradicional domingo de música clássica. 


sábado, maio 25, 2024

Sábado, 25.

Dia copioso de trabalho em várias frentes. Desde logo, pela manhã, retoma da roçaga da erva do lado das figueiras, montagem do cenário de verão no terraço, regas, leituras, cozinhar o almoço, encher a máquina e pôr a secar a roupa da semana que a Piedade passará ferro...  

         - Justamente a minha velha e querida empregada que por aqui anda há pelo menos trinta e cinco anos. Quero-lhe como se fosse membro da família. Quinta-feira, ela, vendo que passei a manhã toda às voltas (fui à estrada alcatroada buscar os empregados do Corte Inglês que trouxeram a mesa e a montaram; depois apareceu o Luís Correia a observar o estado da quinta e assim escolher a máquina que melhor convirá ao corte mato; logo a seguir veio o pedreiro para se inteirar do estado da piscina e apresentar orçamento), tudo isto num vai-e-vem sem paranço que levou a Piedade, gentilmente, a dizer que descansasse um pouco. O trabalho, sempre o trabalho enquanto bênção do céu. 

         - Espanha, Noruega e Irlanda juntaram-se a mais de duas dezenas de países pelo reconhecimento de um Estado Palestino independente. Portugal, como sempre, pequenino e mesquinho, montado em ideias perfeitamente idiotas, não quer “por enquanto” pôr-se ao lado dos países livres e democráticos que se insurgem contra o sofrimento e a pata de Israel. Netanyahu reagiu com novos e violentos bombardeamentos e as inevitáveis mortes de inocentes. 36 mil mortos, cidades inteiras devastadas, sofrimento e ódio q.b. e nada de conseguir trazer os infelizes nas mãos do Hamas. 

         - Almocei ontem com o João no Tascardoso. No passeio pedestre que nos levou a tomar o 727 no Rato, entrámos na livraria Navegante. Mostrei-lhe o livro de Manuel Alegre que eu já por diversas vezes o incentivei a ler, respondeu-me que por trás do meu entusiasmo não me devo esquecer Argélia. Como quem diz, esse período é a pedra no sapato que incomoda os comunistas.  Comprei o livro póstumo de Jean d´Ormesson, Un hosanna sans fin


quarta-feira, maio 22, 2024

Quarta, 22.

Biden que sempre esteve ao lado do criminoso Netanyahu, vem agora dizer que Israel sob o seu comando não pratica o genocídio nem é culpado pelos 36 mil inocentes mortos na Faixa de Gaza. Isto porque o TPI procedeu a mandados de captura do sujeito e seu ministro da Defesa, bem como de três líderes do HAMAS. Um bravo aos jovens americanos e por toda a parte, que exibem a sua indignação apoiando os infelizes palestinianos. Que desde há mais de cinquenta anos têm sido espezinhados, maltratados, mortos, vivendo em condições de sobrevivência e sempre sob a ameaça das armas de Israel e do ódio escarranchado nas suas vidas. 

         - Eu vi o primeiro debate para as eleições europeias e chegou. Depois, acidentalmente, escutei outros confrontos, mas para não me irritar logo desliguei. Porque aquilo pouco ou nada tem a ver com a União Europeia. São as eternas, enfadonhas, travejas e odientas discussões de galos em busca de poleiro. Todos aprenderam pela mesma cartilha o mesmo cinismo, a mesma aldrabice que os portugueses já ouviram e estando fartos deixaram de ir votar nestes e nos vindouros ditos deputados. Para mim, o único partido que sabe o que diz e não é tatibitates, é o IL e, sobretudo, João Cotrim de Figueiredo. 

         - Fui ao médico de família com a caterva de exames e análises que fui colhendo ao longo deste mês. Nunca tinha feito tanto convívio com médicos, clínicas, gabinetes escuros, hospitais, máquinas disto e daquilo, drogas, tempos de espera, numa cena infernal que me esgotou. A jovem médica analisou (é a segunda que substitui a minha adorada doutora Vera Martins de baixa de parto), verteu para o computador dados e números e no final perguntei: “Afinal, doutora, a que se deveu o derrame do início de Fevereiro?” Não teve resposta, porque o coração está óptimo, os rins também, o colesterol idem (baixaram apenas com Danacol) o que sobra de tanto desassossego prende-se com a tensão que anda pelos 15, 16 de máxima. Disse que estava a fazer medicação, mas apenas meio comprimido. “Não deve, deve fazer o comprido inteiro, porque a dose que tem é quase homeopática. Fiquei de pensar. 

         - Na consulta que foi demorada, imiscui-se Virginia Woolf. Mais uma vez ocorreu-me que irei terminar os meus dias utilizando o método de suicídio da escritora. Porque a escrita faz-se com nervos, com todo o sistema nervoso em acção, gritando tensões, palavras, discursos no vazio, varrendo a página em branco de murmuração vinda dos confins do subconsciente. Daí a tensão manifestar-se solta e, decerto, perigosa. Ela tinha visto o filme “Ondas” talvez tirado do livro com o mesmo título. Entrámos por aí. Depois, de súbito, a conversa tem de terminar quando ela se apercebe que tem a sala de espera à cunha. “Você é muito interessante mas... Não diga mais – a conversa sobre Virginia Woolf continua na próxima consulta”, conclui.   

         - A vida de fio a pavio é muito fascinante. Mais tarde, a seguir ao almoço singelo no 1900, caminhei a pé sobre as folhas dos jacarandás em flor. É a Lisboa da minha juventude, toda vestida de cor púrpura, os passeios juncados da sua beleza e fragilidade. Catadupas de recordações a marcar cada passo e as recordações jorravam por mim abaixo, tolhendo-me por momentos para suster as lágrimas que sentia deslizarem pelo meu rosto. Sou irmão destas árvores que embelezam a cidade onde nasci e onde vivi toda a vida com breves intervalos na Foz do Douro. Antes, muito antes, da patetice aproveitadora do turismo de massas. 

Tempo da Covid: as actrizes do teatro D. Maria são as jacarandás 

O Rossio sem vivalma 

         - Comprei o último volume do diário de Marcello Mathias, o Público, o Paris-Match.  

        - Ontem, tendo vários assuntos a tratar em Lisboa, fui mais cedo carregado com o portátil e amesendei na Brasileira, dando instruções aos empregados para que não dissessem aos tertulianos que eu estava no interior. Queria aproveitar para avançar no romance. Duas horas escoaram no meio daquele brouhaha que me era completamente indiferente. No final tinha uma página preenchida e, como raramente acontece, aqui deixo o parágrafo final dessas horas abnegadas de escrita. 

“Estranhamente, o episódio do carro furtado pelos meliantes e todas as consequências daí advindas, contribuiu para a decisão de Ana Boavida quanto à vida dos pombos ocasionais em um casal com ninho e arrolho nidificado no beco Alexandre Ribeirinho. A partir desse dia, Santiago Afonso, passara a pertencer de direito não só à vida da dona da casa, mas também à comunhão dos dias e das noites que atravessam o fio transparente do tempo e acumulam toda a sorte de ocasos e vicissitudes que só ele amarra ao percurso humano. Irremediavelmente.”


segunda-feira, maio 20, 2024

Segunda, 20.

Vou retomar o tema de ontem. Os socialistas e os grupelhos, à sua esquerda, recordaram cheios de saudades a liderança de Augusto Santos Silva que, sem que eles se dessem conta, contribuiu para trazer ao Parlamento cinquenta deputados do Chega. O homem ficou isolado nas últimas eleições, ninguém votou nele, e outro remédio não teve que regressar de cabeça baixa à sua santa terrinha, o Porto. Depois de ter sido a segunda figura do Estado, este recâmbio foi a paga da sua arrogância e poder sobranceiro. Eu sou sempre a favor da liberdade, do livre e solto pensamento, mesmo quando sou atacado. Nunca me chateei com ninguém que me afrontou ao nível das ideias e penso que toda a confrontação é salutar. Aprende-se com o contradito, mesmo com alguma violência na argumentação, porque a liberdade impera por sobre os ideais e só ela consegue afastar os ditadores, os que pensam que a razão está toda do seu lado, os que não dão margem aos outros de dizerem de sua justiça. A esquerda faz da liberdade de expressão um dogma, mas isso é só enquanto não é atacada; enquanto o outro não é obstáculo à representação da condição humana idealizada por ela. A liberdade pára quando alguém ousa ter um pensamento, uma razão, um deturpe ideológico que a faça vacilar. A democracia ficou mais sólida com o novo Presidente da Assembleia da República  Aguiar-Branco. Ele foi corajoso, sobretudo quando, vá-se-lá-saber-porquê, os mass media deitam o ónus da verdade e da democracia, sempre para a esquerda. Proibir a liberdade de expressão, é condenar o outro ao silêncio. 

         - Morreu num acidente de viação o Presidente iraniano, Ebrahim Raisi. Não se esperam alterações políticas no Irão com a sua morte. Pelo contrário, o regime tirânico poderá recrudescer. Curiosamente, ele que condenou à morte centenas de jovens e muitos deles esperam na prisão pela execução, partiu primeiro numa situação que não deve ter sido nada branda e decerto ele teve consciência do fim.   

         - Escrevo estas linhas depois de quinze minutos de sesta. Andei de manhã três horas a roçar mato e sentia-me um pouco fatigado. Tempo taciturno. Estamos a chegar a Junho e eu estou à secretária de manta nos joelhos. 


domingo, maio 19, 2024

Domingo, 19.

O primeiro-ministro da Eslováquia, pró-Putin, sofreu um atentado e está no hospital em estado crítico. O autor é um homem de 71 anos, poeta, decerto conhecedor do país e da política praticada pelo infeliz e pela oposição. Disparou umas quantas balas quando o governante saía para um ofício político, portanto, rodeado de guarda-costas. A Presidente veio à televisão apelar à calma e ao consenso entre facções partidárias que, diz ela, estão muito extremadas. Lá como cá. Não tarda este tipo de ataque acontece, tendo em conta o que se passa todos os dias na Assembleia Nacional. Esta semana foi um escândalo, com o Parlamento inteiro contra o Chega que vive de escarcéus e a oposição não pára de lhe dar púlpito. 

         - O gato reapareceu ao fim de dois dias. Ufa! 

         - Joe Biden teve dois momentos do seu mandato que se portou à altura da típica soberba americana: quando abandonou o Afeganistão e ao ser cúmplice do genocídio dos palestinianos. São duas manchas que um homem da sua idade não devia deixar como testemunho da sua passagem por este mundo. 

         - As esquerdas, sem assunto e do lado paralisado da política, atiram-se a Ventura continuando a dar-lhe tempo lesto de televisão. A mim o que me pareceu, que o líder do Chega quis dizer foi “os turcos não sendo conhecidos por serem o povo mais trabalhador do mundo”, foram capazes de construir o aeroporto de Istanbul em cinco anos, enquanto nós temos precisão de 10 anos para construir o de Alcochete. Foi simplesmente esta comparação que André Ventura fez. Foi infeliz? Talvez. Mas comparando com tantas – mas tantas – outras ouvidas naquele Hemiciclo, desde o tempo de Sócrates onde um governante pôs chifres aos senhores deputados e até em Bruxelas onde os povos do Norte da Europa nos chamaram um povo preguiçoso e gastador, tudo por todo o lado tem sido dito e comentado. Eu sou de opinião que o Presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, foi democraticamente fundamental, quando afirmou que a liberdade de opinião não compete a ele comentar, dirigir, contextualizar, proibir. O PS que neste âmbito tem telhados de vidro, devia estar calado e ocupar-se dos interesses do país de das pessoas – exercício que foi muito mal conseguido quando foi poder. Mais: é apanágio da esquerda cercear o exercício livre da opinião, porque ao fazê-lo limita a liberdade colectiva. E quanto ao racismo, o que tenho a dizer é que a esquerda opera apenas em nome da sua ideologia como, de resto, se pode constatar quando ao dizer proteger os imigrantes, o faz deixando-os à fome, ao frio, à miséria pelas ruas, estações de comboios e casas transformadas em camaradas superlotadas. Há em toda esta polémica uma falta de ideias, um salve-quem-puder dramático, mas a cima de tudo uma impressionante falta de qualidade – palavra criada por Cícero a partir do grego e que tanto foi pronunciada no Senado e campanhas públicas.  Eu, como os meus leitores sabem, não sou de maneira nenhuma apreciador do Chega. 

         - Comecei esta tarde a ler o livro de Manuel Alegre, Memórias Minhas. As primeiras oitenta páginas incitam-me a galopar até ao final de 403. Porque a obra é escrita num português simples, ao correr da pena, estruturado sem pretensões, como se o autor pedisse desculpa por se expor aos leitores. 


sábado, maio 18, 2024

Sábado, 18.

Outro dia fui defraudado. Quando saí do Lidl um automóvel segui-me sem eu dar conta quando ia na direcção do Continente para comprar uma daquelas caixas para transportar felinos. A meio do caminho, sinto atrás de mim um carro que fazia sinais e buzinava. Pensei tratar-se de alguém aflito e parei. Logo veio para mim um rapaz bem parecido, em vestes desportivas, que me disse que eu lhe tinha partido a grelha da frente. Nem me lembrei que quem bate por trás é culpado. A cena teatral onde não faltou a invocação de Deus pelo menos umas cinquenta vezes, era digna da melhor sala espctáculos. De telefone na mão, o rapaz diz-me que o carro não era seu, fora alugado em Torres Vedras e não podia preencher as folhas de sinistro para as seguradoras como eu reclamava, mas que não me preocupasse porque ia telefonar para a Europcar. Vejo-o a gritar, a gesticular, a pedir ajuda a Deus, por fim, diz-me “tem de pagar quatrocentos euros é o que a empresa de aluguer diz custar a grelha”. Vou analisar os estragos, e verifico que ao parar para o ajudar ele, com técnica, bateu no meu para-choques e fez umas ranhuras insignificantes, suficientes para que tivesse motivo para me extorquir dinheiro. Abreviando porque a cena dura muito tempo e eu à medida que os minutos passavam sentia que estava diante de um burlão. Foi quando, após nova cena ao telemóvel, ele me diz que do outro lado aceitam substituir a grelha por outra usada. “São 200 euros, mas eu pago metade e você a outra metade e não se fala mais no assunto..” Tudo isto numa aflição, aos gritos, implorando pressa porque tem de chegar ao destino antes das cinco da tarde de contrário pagaria outro dia de alugar do carro e eram mais 50 euros. Lembro-me de chamar a polícia, mas ele contra-argumenta que são 220 euros e não seria ele a pagar porque quem chama a guarda é que paga. Estamos nisto e eu já cheio de pena dele, que implora Deus todos os segundos, digo-lhe que quero o seu contacto e o da empresa que lhe alugou a viatura. Todas estas indicações anota-as ele num papel que rasgou de um caderno onde li Conservatória do Registo Civil Seixal, pelo meio lembro-me de apontar a matrícula do veículo. Assim que se apanhou com o dinheiro, abalou sem um adeus. Evidentemente, nada daquilo que ele havia escrito no bocado de papel tinha correspondência com a realidade – eu tinha sido burlado e, pior que tudo, com consciência disso. 

         - O Black passou a noite na clínica que o atendeu para o tratar da mordidela no pescoço por um cão. Eu, durante toda a semana, tentei curar-lhe a enorme ferida e vendo que a coisa piorava, levei-o ao veterinário. Bravo, foi com dificuldade que o pus dentro da jaula e o transportei ao médico. Aí, quando se viu em liberdade, atirou saltos contra as paredes e tecto do consultório e foi com objeção que a médica o conseguiu devolver ao transportes. No dia seguinte, pelas cinco da tarde, fui buscá-lo, paguei 150 euros e trouxe-o para casa a antibiótico e outros medicamentos e tratamentos. Jantou bem e até hoje nunca mais apareceu. Já lá vão dois dias. 

         - Quarta fui a Lisboa fazer o derradeiro exame que ditará a razão da hemorragia que tive há dois meses. Pelo que ouvi da médica que o realizou, tenho pequenas pedras nos rins, “mas nada de cuidado. Tem que beber muita água”, diz-me ela. Respondo: “Isso é uma maçada porque passo a vida a caminhar para o quarto de banho.” “Pois é. Mas tem que ser.” Na próxima quarta-feira, munido da talega de exames que venho fazendo desde Fevereiro, quero saber se minha médica de família me diz da razão do acidente nocturno ocorrido ou se a montanha pariu um rato. 

         - Tempo tristonho. Acabei de limpar a área defronte da casa. Vou fazer scones. 


quarta-feira, maio 15, 2024

Quarta, 15.

Um país como a Guiné-Bissau em que o seu presidente apareceu ombreando com Vladimir Putin, pode ser independente e soberano, mas não deixa de inquietar pela opção que fez privilegiando a Rússia do ditador. Diz-me com quem andas... Lenine que na sua obstinação acreditava poder ser omnipresente, dizia que quem pusesse a mão em África, punha ao mesmo tempo a mão sobre a Europa. É isso que um século depois pretende o tirano da Federação Russa.  

         - Encontrou-me numa livraria e veio para mim perguntando-me o que penso de António Bagão Félix. “Um grande senhor, bem formado, culto, sensato, competente.” “Pronto disse, foi essa a impressão com que fiquei quando ele aqui esteve e conversámos um pouco. Agora a  confirmação vinda de si que é tão selectivo, reconforta-me.” 

         - Dia tumultuoso, inútil descrevê-lo nestas páginas. 


terça-feira, maio 14, 2024

Terça, 14.

O diabo não escolhe hora nem local para nos tentar. Aconteceu que depois de deixar a clínica onde fui fazer uma Eco aos rins, desembarquei na Fnac-Chiado, abanquei no bar-café, preparado para duas horas no romance. De súbito, porém, surgiu do fundo da inquietação, um rapazito bailarino, pequeno de corpo, harmonioso, o rabinho fresco pavoneando-se na minha frente, desafiando o pouco de juízo que ainda existe em mim. Atirei com o computador, levantei-me da cadeira, e a meio do percurso onde o mafarrico me esperava e eu queria pedir-lhe contas, arrepiei caminho e voltei para os braços de Ana Boavida que ao seu jeito de ser gargalhou da minha figura.  

         - Fiz questão ontem à noite de ficar a sintonizar a SIC para conhecer a vedeta de momento descoberta por Luís Montenegro. Como nunca ouvira o pimpolho falatar, estava curioso e até disposto a aceitá-lo como fenómeno político à portuguesa. Saiu-me o tiro pela culatra. Quem confirmou o seu saber e conhecimento, a sua capacidade argumentativa e a consistência de ideias, foi o próximo deputado europeu do IL, Cotrim de Figueiredo. Mas também me agradou sobremaneira o rapaz do Livre, pragmático, bem preparado, senhor de ideias desenvoltas e ambos deixaram a quilómetros de distância a impreparada Marta Temido e o outro de seu nome Bugalho (que raio de nome) da AD. Uma e outro, são mestres nas frases feitas, nas banalidades, na argumentação fácil, que cativa mas não convence.  

         - Esta manhã, antes de partir, voltei a reler o capítulo Mil anos sem ninguém do romance de Valter Hugo Mãe. Conhecendo eu os estados de exaltação criativa, o delírio que se instala quando nos deixamos levar pela magia das palavras, invejo-lhe aquelas páginas de uma força incrível, de onde brota toda a dimensão humana e paira algo que não é deste mundo, aqui não medra, apenas passa em voo tangente à eternidade sobranceira ao mistério que é toda a escrita desta qualidade. 

         - Mais um olhar sobre a beleza inquietante das auroras boreais. Desta vez numa cidade dos países nórdicos. 



segunda-feira, maio 13, 2024

Segunda, 13.

Terminei o romance de Valter Hugo Mãe, Deus na Escuridão. Que dizer quando há tanto para contar! Talvez estas palavras sejam suficientes juntas com a frase acima citada de Terêncio que eu poria em epígrafe: forte, belo, sensível e profundamente místico, uma espécie de fenómeno seno-onda. Este e o livro de Lídia Jorge, Misericórdia, são suficientes para nos redimir de todo o lixo que os editores insistem em produzir. Incentivo quem de direito a premiá-lo pela elevada qualidade e originalidade, e peço aos meus leitores que o comprem e leiam com o mesmo entusiasmo que eu tive quando a arte se eleva e elevando nos arrasta com ela para mundos puros de imaginação e beleza. 

         - Em época de auroras boreais, perto desta imponência literária, só os fenómenos cíclicos que a Natureza como os verdadeiros artistas sabe produzir. Esta foto foi tirada no Alentejo e extasia-nos pelo mistério que encerra e a beleza que veicula. 

         - Não me apetece acrescentar nada mais a este dia. Tudo o que possa anotar, é um péssimo e fedorento espécime dos dias que correm, da infelicidade que os enche, da mentira que os banha, da morte que anunciam. Silêncio, pois. Que regresse a vida na plenitude e magnificência enquanto obra divina.  


domingo, maio 12, 2024

Domingo, 12.

“Rezo três vezes por dia; durante grande parte desse período, quando posso, tento manter esse silêncio sem imagens e apofásico, um vazio completo, mas muitas vezes necessito de me apoiar na meditação bíblica, em outros géneros de imagística e na disciplina dos salmos ou de outros textos. Na verdade, faço-o por mim própria, mas também rezo pelos outros e para que o meu silêncio possa ser útil de alguma forma no mundo barulhento em que vivemos. Ganho o meu sustento, faço caminhadas, dedico-me à  leitura e à costura. Penso no silêncio. Sinto-me extremamente feliz na minha casinha. Mas apesar de me sentir feliz e esperançosa, ou talvez mesmo por isso, continuo a achar que o silencio é profundamente misterioso.” Não se pense que sou eu que assim se exprime apesar de o silêncio me ser indispensável e até alicerce da minha vida. Estas palavras são da escritora americana Sara Maitland na sua obra O Livro do Silêncio (pág. 372). 

         - A missa a que assisti via RTP1, foi transmitida da igreja Cristo Rei da Portela, em Lisboa. Pelo que me foi dado observar, é uma capela muito bonita no interior, mas onde só cabem uma dúzia de fiéis, na circunstância os que participaram no coro, na sua maioria jovens. Pela sua singeleza, senti-me entre eles, irmanado na mesma intimidade em Jesus Cristo. 

         - Tenho praticamente concluía a leitura de Deus na Escuridão. Na página 184, deparo-me com esta curiosa interpretação da solidão. O narrador fala do irmão (no romance) que nasceu “sem origens” ou seja com uma qualquer deficiência a nível dos órgãos genitais: “A solidão que  me trazes abre meu corpo ao meio, metade do corpo só sabe cavar, a outra metade só sabe cair.” Aliás o romance está bem abastecido de ideais humanos, levantados da consciência que levou Terêncio a afirmar: Homo sum: humani nihil a me alienum puto. 


sábado, maio 11, 2024

Sábado, 11.

Às sete da manhã estava no mercado dos pequenos agricultores do Pinhal Novo. Às oito prosseguia de máquina roçadora nas mãos a devastação do mato em frente à casa, de seguida fui regar, tudo sem o mínimo cansaço. A maioria dos portugueses, estaria ainda entre lençóis e muitos, sobretudo os que nos desgraçam a vida e nada sabem do esforço quotidiano, sonhavam com a lotaria do Parlamento Europeu. Aliás, se bem penso, os nossos ditos gestores e políticos, são teóricos dorminhocos que não sabem nada de nada. Tomemos o João que faladou anos a fio na Assembleia da República. Tanto ele como a minha querida Marília, não sabem cozinhar mandando vir do restaurante todos os dias as refeições; não sabem pôr a roupa na máquina e vão dá-la à lavandaria que a lava e engoma, e assim por diante. Se eles fossem pobres, ou pelo menos gente normal tecendo nos dias as dificuldades do viver da maioria dos portugueses, compreenderiam que é fácil ser comunista e de esquerda quando as reformas são para esta exuberância burguesa em tudo contrária às teorias que impõem aos demais. Toda a nossa excelentíssima esquerda é deste calibre. São uns pobres patetas, que levam uma vida apartada da luta que nos empolga e renova em nós os ímpetos vivos da própria existência. Eles são seres ociosos, que acreditam no seu trabalho construído no paleio de formação odienta, que muitas vezes não dura uma hora e quando a ultrapassa deixa-nos na lama da desgraça saindo eles sem o mínimo salpico. Lenine e Marx adorados pelos comunistas e Gramsci pela viúva do BE.  

         - Ando a arrumar gavetas e de todas saltam memórias do passado. No caso uns quantos números de A Seara Nova do tempo em que jovenzinho acreditava que era pela via da esquerda – e só por ela – a salvação do país se fazia. Mal eu concebia como fora enganado e nem imaginaria afinal que havia várias esquerdas, várias ditaduras, e que a melhor delas era a que se vivia e vive na Rússia, China, Coreia do Norte, Cuba, etc.. Vou despachar esta aldrabice para casa do João Corregedor que colecciona sonhos para ele verdades que (pagará?) com a vida. Gastei um tempo a folhear a revista e anoto a vergonha de haver sublinhado a grande maioria dos artigos. Muitos dos escritores que nelas participam, trabalhei lado a lado com eles nos jornais, sentei-me à mesa da Brasileira, assisti a comícios depois do 25 de Abril em que eles invocaram a URRS como exemplo de democracia. 

         - Já nessa altura, estamos em 1971, pela pena de Abílio Teixeira Mendes, a saúde era analisada. O SNS foi – e bem – uma conquista da democracia. No entanto, apenas por comparação, retenho que a população de Lisboa rodava 1.611.887 assistida por 3435 médicos, isto daria 469 médicos por habitante. Hoje a Ordem dos Médicos tem inscritos cerca de 55.976 médicos. No Porto, por exemplo, o número de habitantes era de 1.314.794, assistidos por 1773 médicos, é só fazer as contas. 

         - Raul Proença foi outro ilustre político a utilizar a revista. Num artigo intitulado As Aberrações da Democracia, ele dá o exemplo, espécie de lugar comum, que, como se sabe, tomba para os dois lados. “Só quando não houver nem ricos nem pobres, a humanidade verá multiplicar-se à superfície da terra as fontes de generosidade e de sacrifício. A questão económica é, pois, capital na medida em que é uma questão moral – na medida em que o planeta se puder vir a converter numa mansão inteiramente habitável para os que têm sede da bondade e da beleza.” Aqui surge o país do Sol dourado - a URSS. Este sonho, que por natureza nunca se poderá realizar, será aproveitado por toda a espécie de ditadores que vergarão o povo a ideais fantasiosos que lhes permite dominar e estar perto daquilo que eles sabem nunca chegará à totalidade dos seus escravos. 


sexta-feira, maio 10, 2024

Sexta, 10.

Um tal José Castelo Branco, casado com uma milionária americana a viver em Sintra há muito tempo que nunca aprendeu português, faz o entretenimento das televisões. O homem é idiota e está transformado num palhaço que faz rir toda a gente, não se desse o caso de ter agredido a mulher com quem vive há trinta anos e hoje com 95 anos de idade (ele andará pelos 60). No hospital onde está internada, denunciou os maus-tratos psicológicos e agressões que tem sido vítima ao longo dos anos. A polícia que foi chamada, ouviu as denúncias e deu ordem de prisão ao agressor. À chegada ao tribunal, este vinha vestido com um extravagante vestido branco, com capuz, todo ele armado em donzela ofendida e humilhada. Até aqui tudo bem, a maluqueira identifica-o. Só não acho bem que a justiça surja espezinhada, quando consente que um homem (ou lá o que ele é) se apresente travestido. Não pode haver dois pesos e duas medidas: a lei proíbe às muçulmanas andar de véu a cobrir-lhe o rosto e aquela coisa pôde enfrentar os juízos deguisée em prima-dona. Que grande actor de revista à portuguesa! 

         - Há um mês que a tragédia se abateu no Rio Grande do Sul, Brasil. Aquela terra de poetas, está submersa por fortes tempestades que já matam mais de 100 pessoas e fizeram dezenas de desaparecidos e populações de desalojados. 

         - Fui a Lisboa num pé e voltei noutro. Quero avançar com a limpeza em frente à casa e para isso não posso ter veleidades de nenhuma espécie. Travail d´abord. Tempo subitamente quente. Reduziram-me a reforma este mês. Ninguém percebe nada de nada. Vão uns, voltam outros e a confusão é sempre a mesma. Quando penso como são tratados os reformados em França, estremeço. Lá, quando o Robert se reformou, a Segurança Social do sítio, mandou-lhe um dossier detalhado com a história da sua vida profissional. Aqui somos pura e simplesmente abandonados aos caprichos do sobe e desce dos nossos ganhos mensais, sem qualquer explicação. 


quinta-feira, maio 09, 2024

Quinta, 9.

Por muito que queiras fugir do mundo, ele corre no teu encalço. Mas não vem só, traz consigo a desorganização que hoje impera por todo o lado, mas também as guerras, o sofrimento, a miséria e a fome. Por vezes, à mistura, chega um vislumbre de lucidez, uma faísca de luz a brotar dos corações dos homens. É o caso da atitude dos EUA que foram parceiros de Israel na guerra sangrenta contra os palestinianos: Joe Biden decidiu não enviar mais armamento bélico por forma a não ser utilizado em Rafah onde a situação atingiu o auge da desumanidade. A resposta não se fez esperar. Netanyahu insiste que invadirá o Sul da Faixa de Gaza orgulhosamente só, e de ódio em riste, reduzirá a cinzas a população inteira. Nesta atitude, vejo a persistente e corajosa política de contenção do genocídio palestino levada a cabo por António Guterres. Claro que Israel continuará a contar com o segundo armador que é a Alemanha. 

         - Houve tempos que nem sempre apreciava as crónicas de Alexandra Lucas Coelho. A falta deve ter sido minha, ou então o tempo trabalhou para nos juntar. Os anos, ao contrário do que pensamos quando somos jovens, são a maior riqueza da vida. Daí que exponha como exemplo, estas linhas da jornalista outro dia no Público: “O Velho Mundo de que falo não é só a Europa. É o mundo dos líderes que perderam essa lição directa com seres humanos a serem amputados, em todos os sentidos, à nossa frente. Porque os vêem como humanos. Ou humanos à sua altura. Aquela palavra que os nazis usavam, e o Velho Mundo jurou não repetir: untermensch. Sub-humano, menos-que-humano. Todos eles, Scholz, Biden, Von der Leyen tratam os palestinianos como untermensch. (...) Foi o que os poderes do Velho Mundo fizeram desde 7 de Outubro, agir como se os palestinianos não merecessem da vida o mesmo que cada um deles – e cada israelita.”

         - O nosso D. Américo Aguiar, digníssimo político ao serviço do poder temporal, está em todas. Vi-o ao lado do ex-presidente do FCP, naturalmente preocupado com a riqueza e poder do velho dirigente desportivo na hora da despedida. Segundo julgo saber, fez parte da Comissão de Honra à renovação do mandato. Espero que não tenha perdido para Deus o tempo que esbanja em honrarias e frivolidades. 

         - Recomecei a cortar a eito o mato que entretanto cresceu na frente da casa. É a segunda vez e, talvez, não seja a última antes do Verão. A Piedade ajudou-me a fazer um remédio à base de aloé vera para tratar a ferida do Black. Dia magistral. A quinta vista ao rasante do olhar, é um espaço lindo de morrer.  


quarta-feira, maio 08, 2024

Quarta, 8.

De acordo com o mestre Castilho, apresentei-me na Brasileira para um bate-papo saboroso. O homem, do alto dos seus 93 anos cheios de dinamismo e saúde, assentes nas memórias que ele debita sem pausas nem buracos, com vida agitada de ir e vir todos os dias a Cascais, ao volante do seu carro, deixando a mulher na loja que possui no Cais de Sodré e tem muita da sua clientela nos empresários e políticos (Costa é um deles), sobe depois a pé ao Chiado para se encontrar com um grupo que nada (ou pouco) tem com os seus interesses e cultura. E todavia. Com ele posso estar horas a dissertar sobre tudo e nada, pinceladas com a sua enorme simpatia e um sorriso que não desaparece do seu rosto impecavelmente escanhoado, o seu modo elegante de vestir, personagem do século XIX que afronta o presente munido da carga civilizacional que as novas gerações espezinham. Foi na juventude um grande desportista, conheceu a pobreza, trabalhou horas e anos a fio, sem descanso, no limite das forças. Hoje é um homem livre, senhor de uma fortuna sólida (esta manhã despediu-se porque tinha de ir à inauguração de uma loja que arrendou a estrangeiros na Baixa, com interior de Raul Lino), sem exibir a riqueza, sóbrio, de algum modo secreto, personagem de romance com quem tanto simpatizo. O João trata-o de fascista, capitalista e outros mimos que vêm no catálogo do PCP e BE. 

         - Dali fui ao C.I. comprar a mesa para o terraço que o dondoco do Carlos chama lounge. Este ano tenho umas massas a desembolsar para o muito que finou em mobiliário exterior: cadeiras, toldo, almofadas, chaise longue para nada dizer do balúrdio de pôr a piscina a funcionar. Enfim. O que me move é a beleza, o conforto, como se pende-se inteiro para estes pequenos nadas que me fecham na intimidade de ver, viver, admirar. Mesmo que não fizesse uso deste universo de cor e utilidade, contentar-me-ia em ficar horas a admirar e a escutar o que diz todo este cosmos uns aos outros. Porque os objectos falam, interrogam-nos, fazem-se nossos irmãos, contribuem para o nosso equilíbrio e paz.


terça-feira, maio 07, 2024

Terça, 7.

Domingo, preso ao Holter por 24 horas, naquela circunstância de o sentir aos uivos de quinze em quinze minutos, dia e noite, não quis escrever uma palavra que fosse. Em contrapartida, atirei-me ao último romance de Valter Hugo Mãe, Deus na escuridão e li metade do livro. Algo direi quando o terminar. Por agora deixo-me embalar pela história e, sobretudo, pela forma de narrar e do seu típico português. 

         - Ontem, portanto, fui ao cardiologista desembaraçar-me do cão que me mordeu vexes sem conta e fazer o exame Eco Transtorácico. Mais uma vez pude constatar quão a medicina desceu às cavernas fedorentas do dinheiro às carradas, depositado em sacos de serapilheira, como bacalhau apodrecido que nenhuma salgadeira ousa recuperar. O clínico mal me dirigiu palavra. Em dois tempos debitou números e posições que a funcionária despejava na folha do computador, com o aparelho apontado ao meu coração heróico que não lhe deu o prazer de ter pus suficiente que justificasse o exame. No final perguntei: “Então doutor, descobriu algum buraco?” Não respondeu. Perguntou-me se estava a tomar os medicamentos que me havia indicado, respondi que só tomei durante 15 dias o Kainever (que magia!). “Não se dá bem com ele? Pelo contrário, dou-me de tal modo bem que não quero continuar a frequentá-lo.” A assistente olhou-me e sorriu. Ele respondeu lesto estendendo-me a mão indicando-me a saída: “Faça como entender.” A consulta terminou ali, sem que eu pudesse usar o que sei sobre o meu corpo. Queria-lhe mostrar o calendário do registo das tensões e explicar-lhe que ao Mapa Holter tinha forçosamente de registar tensões mais elevadas (ele dizia 15 em média, facto eu sabia porque só ao segundo e terceiro registo a tensão se estabelece nos 14-7 e 13-5).  A impressão com que fiquei, é que de quinze em quinze minutos, a clínica tinha de facturar 130 euros, e upa desaparece e entre o senhor que se segue. 

Eu tinha razão. Quando recebi os dois relatórios (Mapa e Eco) verifico que tenho um coração de pedra. Mas como é de lei, do médico não se sai sem um qualquer problema que justifique a autoridade científica e o montante cobrado, assim nas conclusões do relatório, leio; “Alterações degenerativas das válvulas mitral e aórtica; insuficiência mitral ligeira;  restante ecocardiograma dentro dos limites da normalidade ao nível das estruturas registadas.” E destas, conto, onze parâmetros sem mácula. Quanto as degenerescências, é normal porque não somos os mesmos no adiantado da idade. Ele não gostou que eu tivesse apostado nos medicamentos alternativos, apontando a tensão em média nos 15 graus. Assim vou continuar, sem que seja obstinado no assunto. Quando vir que os suplementos não me ajudam, entrarei sem ressaibo nos químicos. 

         - E contudo! Do fundo do momento chega-me a doçura dos dias, a Primavera a tombar do tempo, a encher os corações do perfume das flores, do ar rarefeito que abraça as manhãs e fica indolente pelas tardes já quentes. Há tanta vida na vida que me coube! Estou a estoirar de prazeres, de sonhos, de energia que catapulte horas e dias, nervo dimensional que não cede à derrota de me saber mortal e livre de ir ao encontro da finitude para esse lugar onde os verdadeiros problemas estão plasmados  e anulam por inúteis todos os ódios e remorsos que a vida carregou no dorso implacável... (interrompido). 

         - Terminei logo pela manhã a razia da erva na parte da casa que dá para o caminho de terra batida. A Piedade veio aí passar a ferro a roupa da semana passada. Estive tempos infinitos a vê-la nessa operação de uma beleza sem fim que sempre me atraiu; porque se trata de um trabalho que acode à memória e junta as recordações de infância num feixe ou bouquet de segredos que guardamos só para nós, e constitui a nossa morada nos longes  labirínticos tornados perto pela recordação em contágio com o absoluto. 


sábado, maio 04, 2024

Sábado, 4.

O PS de Vasco Gonçalves, não pára de nos advertir que “em tempos de crise, só os socialistas dão garantias de estabilidade”. Tal afirmação, incendeia-nos o coração de esperança como forma de nos tomar por parvos. Assim, esta semana, com o descaramento habitual desta gente, depois de ter sarnado Montenegro para não se coligar com o Chega, é ele que aceitou, sorridente, a muleta do Chega para aprovar a eliminação das portagens. O projecto foi aprovado depois de o PS se haver oposto quando era governo. Pelo que se vê, é melhor acreditar na honestidade de Luís Montenegro. Eticamente, os socialista são zero. 

         - No final da semana, também tivemos a revolta de políticos muitos do PS e o desgarrado Rui Rio. A maioria dos subscritores do manifesto, que acusa o MP de funcionar sem escrutínio, esteve na mira da justiça e não gostou. Não gostaram, julgam-se acima da lei e daí tudo fazerem não só para correr com a Procuradora-Geral da República, como pretendem mais autonomia para o poder político. Quando se vê como eles são tratados comparados com o cidadão comum, cheios de papel que entregam a advogados que possuem o condão de adiar julgamentos até perderem o prazo de validade, como possuem a magia de transfigurar assassínios em cordeiros divinos.  

         - Não digo com isto que a Justiça é pura com derrames salvíssimos de protecção e imparcialidade. Sei muito bem que o MP nem sempre é competente e os seus juízos esbarram nos tribunais por mal feitos, mal urdidos e muito amadorismo à mistura. Tomemos o caso da Operação Influencer. Se se vier a provar que o processo de suspeição contra António Costa foi uma cabala para correr com a maioria dirigida por ele, então é todo o sistema nacional da justiça que é posto em causa e é evidente que não podemos confiar em ninguém. Eu detestei e detesto o modo de fazer política dos socialistas, acredito que Costa não é ladrão como Sócrates, mas estou em dúvidas se ele não moveu artifícios políticos para influenciar negócios em torno do lítio e das empresas de dados erigidas no Algarve. 

         - Tentei avançar hoje um pouco mais na limpeza do mato. Amanhã vou pôr um Mapa no braço e durante 24 horas vou andar com ele. Como não deve ser aconselhável o contacto com maquinaria, comecei cedo o trabalho. Dia surpreendente de calmaria. Leitura, escrita, pequenas lides disto e daquilo. 

         - Ontem passei praticamente o dia com o João Corregedor. Combinámos encontro na Brasileira e dali como eu tinha que ir ao C.I. ver uma mesa para o terraço, ele quis acompanhar-me. Almoçámos no restaurante panorâmico. Depois ficámos um tempo em amena cavaqueira com enorme esforço da minha parte para que ele não resvalasse para a única cultura que o absorve – a política. No final ele desabafou: “Porreiro. Conversou-se bem.” Forma de falar, porque quem nunca se calou foi ele num monólogo vigiado por mim.


quarta-feira, maio 01, 2024

Quarta, 1 de Maio.

Para honrar o dia do trabalhador, fartei-me de trabalhar. Não só na escrita e leituras, assim como lá fora a roçar erva, a podar o alecrim da entrada, a continuar a aliviar o jardim dos acantos das ortigas, a cortar os rebentos selvagens das oliveiras, a fazer uma queimada que ainda gora vigio do ponto da escrita É deste modo que me sinto equilibrado. Quando uma actividade fica de fora e é apenas em casa que laboro, falta-me qualquer coisa para que o dia se cumpra em plenitude. 

A beleza dos  acantos em flor. 

         - Louvo a atitude dos jovens universitários americanos que reclamam nas ruas a condenação de Netanyahu há duas semanas seguidas. Enfrentam a violência e a prisão, mas não desistem e são já exemplo para outros movimentos similares em França, Bélgica e Alemanha. Entre nós não há nenhum sinal de idênticos protestos. Os ditos jovens, estão concentrados nas finais, masculina e feminina, dos jogos de futebol. Somos tão pobres, tão idiotas. 

         - O Reino Unido há muito que deixou de ser uma referência civilizacional. Depois da senhora Thatcher, dos hooligans é agora a vez da crueldade democrática do senhor  Rishi Sunak. Este cavalheiro, primeiro-ministro do reino, decidiu extraditar todos os imigrantes que entraram no seu país sem autorização ou trabalho. Pega neles, põe-nos num avião e deposita-os algures no Uganda como quem despeja um montão de lixo. São seres humanos, mas ele decidiu que são dejectos epidémicos. 

         - É muito difícil viver em Portugal sob todos os aspectos. Isto não é uma democracia, os deputados não são representantes do povo, vivem numa bolha completamente alheados dos portugueses, em lutas intestinas permanentes, a ver quem leva a palma sobre o inimigo que eles cândida e cinicamente chamam adversário e dizem ser “a democracia a funcionar”. Todo este ódio, as permanentes rasteiras, os casos e casinhos que brotam do chão por todo o lado, alimentam o virar de costas e o sentimento de que isto só lá vai com um dirigente forte que esteja acima de tudo e de todos como demonstrou uma recente sondagem. Vendo, bem, contudo, isto é falta de educação, civismo, cultura democrática e muita saloiice. Esta gente, lamento dizer, a quem deram um hemiciclo para exibirem tudo o que não possuem ou possuindo  em nome da ideologia se acham no direito de impor aos demais, não passa de novos-ricos inchados de riqueza e poder. Nós estamos lixados. Apostámos na ficha errada.