quarta-feira, maio 22, 2024

Quarta, 22.

Biden que sempre esteve ao lado do criminoso Netanyahu, vem agora dizer que Israel sob o seu comando não pratica o genocídio nem é culpado pelos 36 mil inocentes mortos na Faixa de Gaza. Isto porque o TPI procedeu a mandados de captura do sujeito e seu ministro da Defesa, bem como de três líderes do HAMAS. Um bravo aos jovens americanos e por toda a parte, que exibem a sua indignação apoiando os infelizes palestinianos. Que desde há mais de cinquenta anos têm sido espezinhados, maltratados, mortos, vivendo em condições de sobrevivência e sempre sob a ameaça das armas de Israel e do ódio escarranchado nas suas vidas. 

         - Eu vi o primeiro debate para as eleições europeias e chegou. Depois, acidentalmente, escutei outros confrontos, mas para não me irritar logo desliguei. Porque aquilo pouco ou nada tem a ver com a União Europeia. São as eternas, enfadonhas, travejas e odientas discussões de galos em busca de poleiro. Todos aprenderam pela mesma cartilha o mesmo cinismo, a mesma aldrabice que os portugueses já ouviram e estando fartos deixaram de ir votar nestes e nos vindouros ditos deputados. Para mim, o único partido que sabe o que diz e não é tatibitates, é o IL e, sobretudo, João Cotrim de Figueiredo. 

         - Fui ao médico de família com a caterva de exames e análises que fui colhendo ao longo deste mês. Nunca tinha feito tanto convívio com médicos, clínicas, gabinetes escuros, hospitais, máquinas disto e daquilo, drogas, tempos de espera, numa cena infernal que me esgotou. A jovem médica analisou (é a segunda que substitui a minha adorada doutora Vera Martins de baixa de parto), verteu para o computador dados e números e no final perguntei: “Afinal, doutora, a que se deveu o derrame do início de Fevereiro?” Não teve resposta, porque o coração está óptimo, os rins também, o colesterol idem (baixaram apenas com Danacol) o que sobra de tanto desassossego prende-se com a tensão que anda pelos 15, 16 de máxima. Disse que estava a fazer medicação, mas apenas meio comprimido. “Não deve, deve fazer o comprido inteiro, porque a dose que tem é quase homeopática. Fiquei de pensar. 

         - Na consulta que foi demorada, imiscui-se Virginia Woolf. Mais uma vez ocorreu-me que irei terminar os meus dias utilizando o método de suicídio da escritora. Porque a escrita faz-se com nervos, com todo o sistema nervoso em acção, gritando tensões, palavras, discursos no vazio, varrendo a página em branco de murmuração vinda dos confins do subconsciente. Daí a tensão manifestar-se solta e, decerto, perigosa. Ela tinha visto o filme “Ondas” talvez tirado do livro com o mesmo título. Entrámos por aí. Depois, de súbito, a conversa tem de terminar quando ela se apercebe que tem a sala de espera à cunha. “Você é muito interessante mas... Não diga mais – a conversa sobre Virginia Woolf continua na próxima consulta”, conclui.   

         - A vida de fio a pavio é muito fascinante. Mais tarde, a seguir ao almoço singelo no 1900, caminhei a pé sobre as folhas dos jacarandás em flor. É a Lisboa da minha juventude, toda vestida de cor púrpura, os passeios juncados da sua beleza e fragilidade. Catadupas de recordações a marcar cada passo e as recordações jorravam por mim abaixo, tolhendo-me por momentos para suster as lágrimas que sentia deslizarem pelo meu rosto. Sou irmão destas árvores que embelezam a cidade onde nasci e onde vivi toda a vida com breves intervalos na Foz do Douro. Antes, muito antes, da patetice aproveitadora do turismo de massas. 

Tempo da Covid: as actrizes do teatro D. Maria são as jacarandás 

O Rossio sem vivalma 

         - Comprei o último volume do diário de Marcello Mathias, o Público, o Paris-Match.  

        - Ontem, tendo vários assuntos a tratar em Lisboa, fui mais cedo carregado com o portátil e amesendei na Brasileira, dando instruções aos empregados para que não dissessem aos tertulianos que eu estava no interior. Queria aproveitar para avançar no romance. Duas horas escoaram no meio daquele brouhaha que me era completamente indiferente. No final tinha uma página preenchida e, como raramente acontece, aqui deixo o parágrafo final dessas horas abnegadas de escrita. 

“Estranhamente, o episódio do carro furtado pelos meliantes e todas as consequências daí advindas, contribuiu para a decisão de Ana Boavida quanto à vida dos pombos ocasionais em um casal com ninho e arrolho nidificado no beco Alexandre Ribeirinho. A partir desse dia, Santiago Afonso, passara a pertencer de direito não só à vida da dona da casa, mas também à comunhão dos dias e das noites que atravessam o fio transparente do tempo e acumulam toda a sorte de ocasos e vicissitudes que só ele amarra ao percurso humano. Irremediavelmente.”