quarta-feira, janeiro 29, 2025

Quarta, 29.

Não é de louvar a gestão que os dois maiores partidos têm feito ao longo dos 50 anos de democracia e muito menos o rol de corrupção, interesses pessoais e políticos, que a todos tem banhado. Os primeiros anos após 25 de Abril, trouxeram para a Assembleia da República um naipe de pessoas notáveis, apostadas em fazer desaparecer para sempre qualquer espécie de ditadura (direita ou esquerda), gente honrada, asseverada em fazer a mudança, num equilíbrio sensato que se traduzia nas suas próprias figuras onde não havia nada de reprovável, mas apenas a ambição do bem nacional como bandeira. Depois, a pouco e pouco, os interesses foram-se instalando, o carácter do povo minguando, a cultura subalternizada, a ciência permanentemente a mendigar o lugar que por direito lhe devia ser outorgado, a aridez colectiva voltada para valores passageiros, os três efes combatidos durante o fascismo cresceram, tomaram forma, incendiaram as classes politicas de chinelo que foram tomando alternativamente o poder, a mediocridade como valor fundamental, a honorabilidade um slogan risível, os valores morais espezinhados e a fúria do dinheiro como elemento maior da existência humana a rasgar consciências e a inundar a sociedade. Os partidos deixaram de ser factores de diálogo e alternância e passaram a ser gaiolas com galos loucos ensandecidos pela ambição e o poder a todo o custo. O povo, no seu quotidiano humilde, o seu casco de escravo, desorientado, corria para o lado daquele galifão que melhor sabia manejar a arma da demagogia, que reivindicava em seu nome, mas chegado ao poder o esquecia e espezinhava. Depois, no provincianismo próprio do patego político, veio a Europa juntar-se num coro de corruptos e desajeitados, inchados da importância de se saberem a opinar ao lado daqueles que possuíam os valores culturais de então e a riqueza que a indústria lhes propiciara e nós deixámos cair e até hoje não recuperámos. Transformámo-nos num país de aluguer de camas, num batalhão de funcionários públicos, destruímos o SNS, vexámos os professores, somos agora uma imensa população de pedintes vivendo de subsídios, das esmolas de Bruxelas, da pobreza que foi crescendo enquanto a democracia diminuía. Estamos entregues, de mão estendida, ao ricaço que passa à nossa porta sem muros, sem direito a reivindicar porque já pouco resta para reclamar. Tornámo-nos subordinados daqueles que entraram no nosso país aos baldões, desorganizámos a sociedade, criámos ódios e invejas, ficámos num lódão fedorento que afasta os melhores e mais sadios. A própria Igreja resvalou, foi na corrente de lama que a sociedade alimentou, resvalou na miséria sexual, aproveitou-se de um povo fraco, sem defesas, alcandorado nos seus valores que tinham Deus como tirano. O terramoto era inevitável. As forças contrárias que espreitam a vez, nunca adormeceram. Uma sociedade montada neste vazio que faz medo, esfarela as consciências, e conduz os melhores dos seus ao aniquilamento, é uma sociedade pronta a ser tomada pelos Donald Trump deste mundo mercantil, onde cada cidadão tem um preço, sim, mas irrisório.