domingo, março 02, 2025

Domingo, 2.

Apreciei a forma como Luís Montenegro se dirigiu aos portugueses a propósito do ataque sem precedentes que lhe fizeram todos os partidos. Acho que ele foi imprudente na maneira como ordenou a sua vida pessoal com o cargo que ocupa. Todavia, ao contrário de muitos outros governantes socialistas, não cometeu nenhum crime, não roubou o erário público, não escondeu dinheiro nos gabinetes ministeriais, não concedeu favores a este e àquele amigo. Pelo contrário, a sua gestão é exemplar: no modo, no feitio, na abordagem dos assuntos, na discrição, na entrega à causa pública, na eficiência. Ele e toda a sua equipa, é gente competente, que tem tentado endireitar aquilo que António Costa destruiu, malbaratou, tarefa nada fácil com a guerra (é só isso que lhes interessa) dos partidos para ganharem o poder. Digo mais. Tenho a certeza se formos para eleições e ele se recandidate, obtém a maioria. Está toda a gente farta destas lutas, daquelas carantonhas da Pasionaria do BE à dos cãezinhos, da fúria do Vasco Gonçalves à réplica trumpista do Ventura. Suceder ao desastre António Costa, é um trabalho hercúleo que poucos conseguem realizar. A esquerda, que nunca trabalhou e cedo se encostou aos partidos, não sabe o que é dirigir uma empresa, o que é ser trabalhador e governar-se com o salário no limite, desconhece a luta do empresário para vencer com os trabalhadores às costas, os impostos a pagar, a concorrência desleal, a sofreguidão dos bancos... Ser deputado, é estar ali às ordens do partido, a maioria nunca chega a abrir a boca durante todo o mandato, é passivo, reverente, submisso. No fim do mês, na conta bancária, caiem-lhe 4 mil euros – é tão bom ser superior ao comum dos mortais... pelo montante salarial saído dos nossos impostos. 

         - O clube de ganguesteres que governa a América, na sua ignorância, ganância e desequilíbrio, contribuiu (assim espero) para a união da Europa. Não só com esta como com outras grandes nações do mundo que conhecem e saboreiam a riqueza da democracia. Zelensky e a sua Fronteira (Ucrânia) saiu ganhador daquele confronto primário que tentou amedrontá-lo, humilhá-lo, prendê-lo aos valores dos minerais que tanta gula despertam ao Don Corleone (como o apelida Teresa de Sousa). Contudo, do que agora se fala é do nuclear. Na Europa só a França e o Reino Unido o possuiu e este dependente dos EUA. A senhora Le Pen já veio dizer que o nuclear deve ficar circunscrito à defesa da França. Don Corleone não diria melhor. Antes de 1991 suponho, a Ucrânia também tinha armas nucleares, mas entregou-as à Rússia e aos Estados Unidos quando assinou o Tratado de Budapeste, em 1994, com os Estados Unidos, Rússia e Reino Unido a troco da sua independência e segurança das suas fronteiras. O que fez a Rússia do tirano, todos conhecemos. 

         - Não costumo trazer para este encontro o mestre de tanta escrita, cujas histórias conheço desde que entrei para o jornalismo, senhor Miguel Esteves Cardoso. Tenho simpatia por ele, mas talvez gostasse mais no tempo em que a sua vida se multiplicava num saboroso apimentado. Eis o que ele diz sobre o momento presente: “Perante aqueles broncos inchados, Zelensky não pestanejou. Foi buscar força a todos os ucranianos que morreram por causa da invasão russa. Foi buscar força ao facto de estar em guerra, comparando essa violência e esse medo à mera truculência verbal daqueles dois pavões obesos à frente dele. O homem pequenino mostrou que não se curva – e que foi por não se curvar que a Ucrânia continua a lutar contra o monstro que (a) invadiu.”   

          - Tempo soturno. Quando precisávamos de sol, o céu oferece-nos um dia sincelo. Saí por momentos para comprar o jornal e tomar café. Aqui em casa, a lareira acesa, entrego-me às leituras, à escrita, à deambulação por mundos idos. Há duas semanas findei o volumoso livro de Gustave Flaubert, l´Éducation sentimentale. Fabuloso testemunho de uma época, a metade do século XIX, entre 1840 e o golpe de Estado de 1851, em França. Foi um trabalho que revolucionou o romance, com o fresco incrível das transformações ocorridas na sociedade francesa e por tabela, nessa época, noutras sociedades que tinham no espírito francês o suporte, a par da evolução da quantidade de personagens na mudança da monarquia para a república, com todos os acontecimentos morais, políticos, partidários, murados numa filosofia da história onde se encontram os estados de alma mais díspares, a efervescência do capitalismo em gestação, os costumes sociais e religiosos, num panorama absolutamente surpreendente de narrativa ensaísta que cruza a realidade histórica com a criação literária. Os grandes temas e opções políticas que haveriam de transpor para o séc. XX, com as teorias de Marx, Proudhon e tantos outros, a inflamarem os primeiros raios de sol do século XX e derrocada do Império em 1848.