terça-feira, novembro 05, 2024

Terça, 5.

Deixei-me levar na torrente da chuva batendo nas janelas. Ela tinha o mesmo timbre do silêncio de asas abertas no dia encolhido de tristeza. Pensei ir nadar, mas o rumor, lá longe, onde as dores se acolhem, reteve-me. No caminho de terra batida aonde chego quando daqui parto, não passava vivalma. Havia, todavia, no túnel de arvoredo encharcado, um mistério que não ousei decifrar e se fez a pouco e pouco uma memória por inventar. Desviei o olhar das estantes de livros quedos, do rumor das vozes surdas que proliferam por toda a casa e fiquei quedo a escutar tudo quanto não ousarei divulgar. Há um mundo que me espera, mas eu hesito em conhecê-lo, a mente perturbada pela incógnita que sobrou dos anos vividos. Sem pressas, contudo, vou-me aproximando, espreitando quem foi adiante, e nada rima com o salmo decantado levantado das cinzas dos mares.