sexta-feira, fevereiro 21, 2025

Sexta, 21. 

A anedota do ano relacionada com o SNS que não digo tenha sido montada por António Costa embora ele tenha ajudado, diz respeito à vergonha, ao desprezo pelo cidadão, à excessiva dependência das ordens do Governo em liquidar o pensamento próprio de cada funcionário, ao impor regras rigorosas que retiram humanidade ao sistema e não responsabilizam ninguém pelos actos inumanos que praticam. Assim, esta semana, um pobre idoso cai desamparado no grande largo em frente ao hospital de Évora Os transeuntes acodem, chamam alguém do hospital diante dos seus olhos que nega vir em seu auxílio, por fim chegam os bombeiros e nem eles têm autorização de levar o infeliz sem que antes tenham ordem expressa do Saúde 24. Este ridículo trágico, é a imagem de uma democracia voltada do avesso, é o retrato de um sistema burocratizado, onde os ideais de Hipócrates estão mortos e enterrados e com eles a sua natureza, copiada por um homem honesto, competente e humano, sempre com um leve sorriso na face, António Arnaut. 

         - Cada português tem uma história para contar sobre o sistema de saúde. Eu tenho a minha que ainda ontem me levou ao Instituto Gama Pinto porque, em vez de estar a ser operado à catarata, tinha recebido na véspera uma carta a dizer que não seria operado “porque faltei a uma consulta no dia 30 de Setembro do ano passado”. Uma mentira que me foi fácil desmontar. Todavia, por descanso, fui consultar o que tinha registado neste Dário e lá estava narrada a consulta que agora dizem nunca ter acontecido. Fui muito bem atendido e compreendido por um jovem da secretaria do hospital que, à medida que eu ia debitando datas, actos médicos e referências pessoais, ia conferindo no computador a minha verdade. No final disse-me que iria apurar a veracidade da carta e depois me telefonaria. “É verdade que está tudo em ordem”, descansou-me. 

         - Continuemos. Tendo acordado às seis da manhã para chegar à oftalmologia às oito, fui depois à Brasileira festejar com o Vergílio os seus 93 anos. Só não participei no almoço porque tinha a consulta com a Dra. Vera Martins às 14,30. Bref. Levei-lhe os exames que estavam, afinal, todos bem à excepção do da coluna e colesterol e mais uma vez não aceitei tomar as Sinvastatinas. Quanto à coluna, disse-lhe que as dores tinham desaparecido e quando pensava que me iria receitar anti-inflamatórios, disse-me que tomasse Ben-U-Ron quando sentisse dores e nadasse. Bela prescrição! 

         - Não quero deixar de contar a queda (há muitos meses que não caía) quando tentei acudir ao Virgílio na descida da esplanada do café. Cuidei que ele ia a tombar, mas quem acabou no chão fui eu, não tendo dado atenção ao degrau que aí existe onde há uns anos também me havia espojado como se fosse um novel sacerdote diante do Papa Francisco a ser ordenado padre. À parte o joelho direito um pouco estragado, nada de grave daí resultou. Esta manhã, o enxame de rapazes de mesa (que ontem não estavam de serviço), a saber como me sentia. Simpatia. 

         - Escrevo estas linhas no café da Fnac. Aqui ao lado, na mesa voltada para a rua, está um homem a ler, atentamente, um dos três grossos volumes que tem sobre a mesa. Ao lado dele está, provavelmente, o seu colchão e num saco azul com os seus pertences. Não cheira nada bem, e talvez seja um desses vagabundos que a cidade acolhe com indiferença. A roupa não vê água há muito tempo e a boina que tem na cabeça a suportar o cabelo em tranças até ao pescoço, é imunda. Mas quanta dignidade, meu Deus! Lê com profundo interesse, mergulhado numa liturgia que ele criou para se isolar do mundo desgraçado que o acolhe desviando o olhar da majestade suprema que o interesse pela cultura honorifica.