terça-feira, dezembro 03, 2024

Terça, 3.

Que mundo, meu Deus! Apesar da abundância, da vida aparentemente mais feliz, da liberdade de cada um viver viajar para aonde lhe apetecer, dos avanços da medicina e da ciência, do conhecimento em geral, o homem não perdeu o sentido de posse, de inveja, de lucro a todo o custo, da exploração dos mais fracos, da ingratidão, do posto como lugar de domínio e controlo, de costas voltadas à igualdade, à fraternidade, à interajuda e ao reconhecimento do outro como seu irmão. Daí o desarranjo do mundo de hoje, onde as guerras proliferam, o sofrimento impera, a esperança morreu e o quotidiano é um empurrar para a morte milhões e milhões de pessoas, a destruição da terra, o zumbido dos canhões e dos mísseis anunciando o holocausto e o anúncio de outro mundo onde nós não estaremos para a gigantesca tarefa do enxugar as lágrimas, do varrer das cinzas, do recomeço. 

         - Assim, todos os dias, o ribombar dos canhões, os gritos de liberdade, de injustiça e escravidão são o flagelo que projecta em cada olhar a estupefacção e o medo. Ontem os ucranianos, os palestinianos, os haitianos, os arménios; hoje os romenos, os sírios, os georgianos, os libaneses... Todos, bem vistas as coisas, pretendem o reconhecimento da sua verdadeira identidade. Aqueles que vivem em democracia, pelo voto; os que estão sob outras quaisquer formas de controlo, pela violência. Por sobre todos eles, esgrimindo os seus interesses, estão a Rússia, os EUA, a China. Estes senhores do mundo, mais não desejam que ter o controlo daquilo que não lhes pertence, mas é objecto da sua lambugem – as riquezas naturais de cada país. Por este monstruoso domínio, constroem-se estratégias, liquidam-se adversários, dividem-se povos, destroem-se cidades e vilas, matam-se milhares, impõem-se ideologias à matracada. Até quando? E como vai acabar esta voracidade? Os Evangelhos seriam infinitamente mais compreensíveis de aplicar, porque a sua doutrina é desprendida de tudo o que expõe o ser humano à humilhação, à divisão, à saciedade. 

         - Tiblíssi está a ferro e fogo devido ao resultado das eleições que deram a vitória, não esclarecida, ao governo derretido de simpatias por Putin, contrário à entrada do país na NATO e UE. Há muito que a Geórgia faz esforços para entrar na União Europeia, projecto que o déspota do Kremlin não aprova. Este foi mais um dos antigos países da URSS, ou seja do império que Putin quer restaurar e vai fazê-lo se a Europa não compreender o que está em jogo. Eu tenho simpatia pelos georgianos e gostaria de visitar o país no próximo ano. Se entretanto, Putin, não vier a invadi-lo como fez à Ucrânia que, recorde-se, começou por ter para cima de um milhão de ucranianos em Kiev a gritar pela UE. 

         - A realidade, infelizmente, é esta: onde a política entra, destrói tudo. (Lembra-me o conceito de Lenine já aqui anotado: “Se queres acabar com a religião, introduz nela a política.) Veja-se o caso de Évora em vias de se tornar a Capital Europeia da Cultura. Os pacóvios querem tudo dominar, mas não possuem cultura, saber, equilíbrio, dignidade. Paula Garcia, signatária do programa Évora 2027, mereceria todo o respeito – não senhor, foi obrigada a demitir-se por saturação e esquemas e interesses criminosos alheios aos objectivos traçados e aprovados.

         - Dia feliz. Deixei de ir à piscina para realizar todas as empreitadas programadas. Para isso, houve que optar por não sair deste espaço onde o seu proprietário é tão livre como os pássaros. Ontem, debandei para afazeres em Lisboa, realizados à pressa, para me ir instalar na FNAC e trabalhar três horas no romance. Uma passagem que me atormentava foi desbloqueada por sortilégio do trabalho e de muito pensar; mesmo para o seu criador, este imprevisto, trouxe a magia da criação. Contudo, no trabalho desta manhã, criei um novo imbróglio que não sei como resolver.