Quarta, 4.
Um livreiro que me conhece e a quem comprei o livro de Jean d´Ormesson, Un jour je m´en irai sans en avoir tout dit que não conhecia, em conversa amena, diz-me que os jovens lêem para se evadirem e deixarem de parte a canga tecnológica, musical, futebolista e familiar. “Enquanto lêem não pensam, mesmo que seja um livro de histórias banais, distrai-os.”
- Um outro livreiro no Corte Inglês, tentando convencer-me a ler este e aquele livro que ele ia retirando das estantes certo que me atraía a comprá-lo, ante o meu torcer de nariz, atirou: “Eu sei que você é especial, que é muito selectivo, mas este livro é de um autor muito espiritual...” Rematei: “precisamente por isso é que tenho dúvidas se me interessa”.
- Trump discursou no Congresso. Durante mais de uma hora, auto-elogiou-se, o ego ardendo diante dos seus súbditos. Passou em revista o que fez no mês que leva de governação, com especial ênfase na área económica, na expulsão dos imigrantes atirados acorrentados para camiões e comboios, ameaçou o mundo ocidental com tarifas a partir de Abril, e disse ter já acabado com “a tirania da política de diversidade e inclusão de todo o governo federal” afirmando que “o nosso país não será mais `woke´, congratulou-se com a mudança do Golfe do México para Golfe da América e ameaça anexar a Gronelândia, entre outras benesses à Trump. Deteve-se também a falar da carta que Zelensky lhe enviou para retomar o contrato de exploração dos minérios das terras raras e ainda lhe sobraram uns minutos para glorificar Elon Musk como o homem certo no lugar certo para correr com os funcionários públicos, sair da OMS e da ONU. A UE tremeu, os débeis governantes que a dirigem, têm chiliques quando o homem fala. E não passam disso. Um copo de água reaviva-os de novo para a sonolência em que vivem. E a retoma de novos debates em pescadinha. Penso em Nicolau de Cusa: “A dialética inerente a este saber do não saber.”
- Eu vejo mais este contrato das terras raras como uma desgraça, uma capitulação para a Ucrânia. Desde que saiu da reunião com os ingleses e os outros compagnons de route, Zelensky, percebeu que com eles não podia contar. Só, ele que foi o agredido, que viu o seu país desfeito em entulho, viu morrer milhares de soldados e civis, teve a vida parada, noites e dias, durante três anos, à espera dos mísseis russos, ele que tanto se entregou à UE, à NATO, em viagens constates de desespero, outra decisão não lhe resta que estender a mão ao seu algoz. Putin, a toupeira, aguarda que as terras lhe sejam entregues nos braços abertos, um sorriso demoníaco traçado no rosto de mármore.