quinta-feira, outubro 31, 2024

Quinta, 31.

Desforro-me agora por todo o lado e de todas as maneiras do grande período de reclusão com saídas precárias. Assim, hoje fui à piscina e estive a nadar durante uma hora praticamente de seguida; outro dia fui a uma esplanada e fiquei um tempo esquecido a saborear a liberdade que tanta falta me fez; ainda outra vez fui ao supermercado e deu-me para me satisfazer de tudo quanto via, estive depois no pequeno bistrot da entrada a ler o Público como se fosse a primeira vez. Tanta largueza de impulsos trazem a marca de uma vida escolhida, obstaculizada apenas pelos imprevistos que nos atingem a todos. Entre este percalço e uma existência fechada num tabuleiro chique ou remediado, com vista para os telhados simétricos da grande urbe, escolho mil vezes este recanto onde vejo o Sol nascer, as noites estenderem-se no dorso limpo das recordações vividas, das paixões sofridas, dos silêncios arrebanhados da impressão clara da vida... 

         - A martirizada Espanha atingida por um temporal medonho que destruiu povoações, reduziu Valência a escombros, matou para cima de uma centena de pessoas e arrasou bairros inteiros, transformando-os numa papa de lama onde os cadáveres dos infelizes jazem, atirando os seus moradores para as ruas, em desespero, de súbito sem tecto nem haveres. O Sul o país está paralisado, pontes desfizeram-se, auto-estradas desapareceram, prédios caíram, um sem-número de carros levados na enxurrada, Espanha surpreendida, parou. Ricos e pobres defrontam-se na mesma condição. 

         - O mundo civilizado e livre, ficou estupefacto com aquela vénia respeitosa e obnóxia de António Guterres ao ditador Vladimir Putin. Deslocou-se o nosso compatriota a Moscovo onde o tirano reuniu uns quantos países que compõem os BRICS para o endeusarem. Tanto o nazi precisa de gente como o secretário-geral da ONU! Definitivamente o nosso socialista não acerta uma, parece até que é naïf, pouco experimentado em lidar com a casta reles dos políticos dos nossos dias. Aquele acrómio, cujos países fundadores foram a Rússia, China, Índia alguns mais e outros que se lhes juntaram, pretende ultrapassar ou comparar-se com o dólar e enfrentar as economias ocidentais e americanas. Mas não têm hipótese, pelo menos nos próximos anos. Compare-se só este pormenor: o banco dos BRICS conta, este ano, empréstimos no valor total de 5000 milhões de dólares; o Banco Mundial 72.000 milhões. Daí que eu me incline para outras pretensões por parte de Moscovo. A Putin tudo serve para a sua sobrevivência. O fim está próximo. O mundo não tarda a dar-lhe a reposta que merece. 

         - Justamente. A Israel tudo lhe é permitido. Agora, Netanyahu, quer enfrentar todos os países que compõem as Nações Unidas e fez passar uma lei proibindo operações da agência da ONU na ajuda aos refugiados palestinianos, a UNRWA. Guterres respondeu que “a legislação nacional não pode alterar essas obrigações”. Será? Dentro de Israel quem manda são os ortodoxos em que o ditador se apoia. São eles que escorraçam os funcionários da ONU dos territórios ocupados, num genocídio praticado à frente de todo o mundo. Eles hão-de vingar os seis milhões de judeus exterminados pelos nazis. 

         - Vou transcrever num arrepio: entre 2015 e 2023 foram identificados 836 casos de casamentos infantis em Portugal.  A maioria têm 15 e 18 anos, mas há 126 situações que envolvem crianças de 10 e 14 anos; 346 entre os 15 e 16 anos, sendo os rapazes com menos de 18 anos os mais afectados. Como é isto possível num país organizado, com fiscalização de muita ordem, leis que nos dizem algumas serem neste domínio das mais avançadas da Europa (quiçá à moda portuguesa), do mundo?